Entrevista com os criadores – Edição 13: The Legend of Zelda: Echoes of Wisdom – Capítulo 1
02/10/2024
Alguns vídeos e imagens aqui apresentados foram criados durante o desenvolvimento do jogo.
O conteúdo deste artigo foi publicado originalmente em japonês.
Nesta 13.ª edição de "Entrevista com os criadores", uma série de entrevistas em que vários criadores da Nintendo transmitem, nas suas próprias palavras, o que pensam sobre o desenvolvimento de produtos e os pontos específicos mais críticos para cada um, falamos com alguns dos criadores por detrás de The Legend of Zelda: Echoes of Wisdom para a Nintendo Switch, disponível a 26 de setembro.
Capítulo 1: Duplamente gratificante
Capítulo 3: A princesa Zelda na sua própria aventura
Capítulo 4: Aquela sensação autêntica do estilo Legend of Zelda
Capítulo 1: Duplamente gratificante
Em primeiro lugar, posso pedir-vos que se apresentem sucintamente?
Aonuma:
Olá, chamo-me Eiji Aonuma e sou o produtor da série The Legend of Zelda. Neste jogo, pedimos à Grezzo (1), o experiente estúdio de desenvolvimento de jogos que trabalha há vários anos em remakes de jogos da série The Legend of Zelda, para criar um jogo The Legend of Zelda completamente novo. Colaborámos para concluir este projeto. Enquanto produtor, eu joguei-o na perspetiva do jogador e fui dando sempre o meu parecer.
(1) A Grezzo Co., Ltd. é um estúdio de desenvolvimento de jogos fundado em 2006. Além de desenvolver remakes da série The Legend of Zelda, como The Legend of Zelda: Ocarina of Time 3D para a Nintendo 3DS e The Legend of Zelda: Link's Awakening para a Nintendo Switch, também esteve envolvida no desenvolvimento de remakes de outros títulos, como Luigi's Mansion para a Nintendo 3DS e Miitopia para a Nintendo Switch.
Sano:
Olá, chamo-me Tomomi Sano. Fui diretora deste título no lado da Nintendo. O meu papel foi gerir e coordenar a produção deste projeto, sugerir ajustes e depois verificar o resultado, para garantir que o jogo criado pela Grezzo se alinhava com a série The Legend of Zelda.
Terada:
Olá, sou o Satoshi Terada, da Grezzo. Comecei por ser designer e fazia sobretudo design de terreno e de níveis (2), mas esta é a primeira vez que sou diretor de um projeto. Participei pela primeira vez na série The Legend of Zelda no remake de The Legend of Zelda: Ocarina of Time (3). No projeto anterior, o remake de The Legend of Zelda: Link's Awakening (4), fui responsável pelo desenvolvimento do estilo de arte, dos fundos 3D e da iluminação. Esta foi a primeira vez que a Grezzo trabalhou num jogo novo da série The Legend of Zelda.
(2) Determinação do posicionamento de objetos no ambiente de jogo e criação dos níveis.
(3) The Legend of Zelda: Ocarina of Time 3D é um jogo para a Nintendo 3DS, lançado em junho de 2011. Trata-se de um remake de The Legend of Zelda: Ocarina of Time, um jogo para a Nintendo 64 lançado em dezembro de 1998, com gráficos atualizados e elementos novos.
(4) The Legend of Zelda: Link's Awakening é um jogo para a Nintendo Switch que foi lançado em setembro de 2019. Trata-se de um remake de The Legend of Zelda: Link's Awakening, um jogo para a Game Boy, lançado em junho de 1993 no Japão (e em dezembro de 1993 na Europa). Incluía gráficos com estilo de diorama e elementos novos como Chamber Dungeons.
Obrigado. Já agora, a Sano-san é a primeira mulher diretora na série The Legend of Zelda. Em que outros títulos trabalhou no passado?
Sano:
Antes deste projeto, a minha função principal era apoiar o diretor. Em relação aos remakes em que a Grezzo trabalhou, participei em The Legend of Zelda: Ocarina of Time 3D, The Legend of Zelda: Majora's Mask 3D (5) e The Legend of Zelda: Link's Awakening. Também estive envolvida em The Legend of Zelda: Twilight Princess HD (6) e em alguns títulos da série Mario & Luigi (7), lançados antes de Mario & Luigi: Brothership, com lançamento agendado para novembro deste ano.
(5) The Legend of Zelda: Majora's Mask 3D foi lançado para a Nintendo 3DS em fevereiro de 2015. Trata-se de um remake de The Legend of Zelda: Majora's Mask, um jogo lançado para a Nintendo 64 em abril de 2000 (em novembro de 2000 na Europa), com gráficos e controlos atualizados.
(6) The Legend of Zelda: Twilight Princess HD foi lançado para a Wii U em março de 2016. Trata-se de um remake de The Legend of Zelda: Twilight Princess, um jogo lançado para a Nintendo GameCube e para a Wii em dezembro de 2006, com uma atualização visual. Era possível jogar com controlos intuitivos no comando Wii U GamePad.
(7) Uma série de RPG de ação com Mario e Luigi, na qual os irmãos trabalham juntos para superar mistérios e batalhas que encontram nas suas aventuras.
Aonuma:
Eu peço-lhe quase sempre para participar nos remakes de The Legend of Zelda em que a Grezzo trabalha.
Estou a ver. Sendo assim, a Sano-san é uma parte essencial dos jogos The Legend of Zelda desenvolvidos pela Grezzo. Então, Aonuma-san, pode dizer-nos que tipo de jogo é este?
Aonuma:
Claro. The Legend of Zelda: Echoes of Wisdom é um novo jogo The Legend of Zelda com vista de cima para baixo que se centra na princesa Zelda como protagonista principal. Fendas misteriosas aparecem no reino de Hyrule e pessoas, objetos e até o rei de Hyrule e o Link são engolidos pelas fendas.
A história centra-se na princesa Zelda, que parte numa aventura com o ser etéreo Tri, usando a capacidade de criar imitações de vários objetos para salvar o povo de Hyrule. A princesa Zelda é capaz de brandir um bastão, chamado cetro do Tri, para criar cópias de objetos como mesas, por exemplo, que pode usar como plataformas para chegar a lugares mais altos, ou cópias de monstros que lutarão por ela. Chamámos "ecos" a essas imitações e incluímos muitas formas novas de jogar com elas.
Obrigado. Usou a expressão "um novo jogo The Legend of Zelda com vista de cima para baixo". O que levou ao desenvolvimento de um jogo novo nesta altura?
Aonuma:
Na verdade, eu sempre quis implementar uma série The Legend of Zelda 2D com vista de cima para baixo que fosse distinta dos jogos 3D como The Legend of Zelda: Breath of the Wild. O estilo de jogo e a jogabilidade são completamente diferentes quando o mundo é visto em 3D, atrás da personagem, ou quando é visto de cima para baixo. Quisemos valorizar essa diversidade da série The Legend of Zelda.
No meio de tudo isso, sentimos que o remake de The Legend of Zelda: Link's Awakening na Nintendo Switch, que desenvolvemos com a Grezzo, se tinha tornado a nossa nova abordagem em termos de gráficos e jogabilidade, enquanto jogo The Legend of Zelda com vista de cima para baixo para a geração Nintendo Switch.
A Grezzo tinha implementado uma forma excelente de trazer de volta a experiência The Legend of Zelda com vista de cima para baixo para a era moderna, pelo que pensei que podíamos desenvolver algo completamente novo que nunca tivesse sido feito.
A maioria dos jogos The Legend of Zelda em que a Grezzo trabalhou antes deste jogo foram remakes. Visto que desta vez estão a criar um jogo novo, isso mudou significativamente a vossa forma de trabalhar com a Nintendo?
Aonuma:
Sim. Naturalmente, muitas coisas mudaram. Uma mudança grande foi que, no início do projeto, pedimos aos funcionários da Grezzo que partilhassem internamente as suas ideias para este novo jogo The Legend of Zelda. Mais especificamente, perguntámos à Grezzo: "Se criassem o próximo jogo novo, que tipo de jogo gostariam que fosse?" Tivemos a oportunidade de ouvir ideias de membros da Grezzo, que as apresentaram livremente.
Terada:
Foi um grande projeto para a Grezzo. Depois de todos os remakes que fizemos, foi a primeira vez que fomos desafiados com um projeto novo desde a fase conceptual. Houve até um momento em que todos os funcionários da Grezzo estavam a pensar em ideias. (Risos.)
Graças a isso, tivemos tantas ideias que demorámos três dias a ouvi-las e a analisá-las. Como era um projeto Legend of Zelda, todos trabalharam muito nas suas propostas e apresentaram-nas ao Aonuma-san com o coração a palpitar. (Risos)
Aonuma:
Eu trabalho com a Grezzo há muito tempo... (Risos.) Mas quando trabalhávamos nos remakes, não tínhamos oportunidade de ouvir as ideias de todos. Desta vez, pedimos a todos, não apenas a quem planeava o projeto do jogo, mas também aos designers e programadores, que sugerissem muitas ideias.
Sano:
Dezenas de pessoas participaram e, embora não se tenham reunido para pensar em ideias, foi surpreendente que tenham dado várias sugestões semelhantes. No entanto, isso não é nada mau. Julgo que todos tinham uma ideia em comum de algo que queriam fazer num jogo e que se adequava perfeitamente ao mundo de The Legend of Zelda.
Terada:
Por isso, analisámos as ideias que foram sugeridas e escolhemos várias que pareciam ser boas. A partir daí, decidimos avançar focados na jogabilidade de copiar e colar (8) combinada com uma vista de cima para baixo e uma vista lateral.
(8) Mecânica que permite ao jogador copiar algo do terreno e colá-lo noutro lugar. Por exemplo, se copiarmos uma mesa e a colarmos muitas vezes seguidas, podemos usar essas cópias para criar uma escada, e, se copiarmos um inimigo e o colarmos à frente de outro inimigo, ele lutará por nós.
Aonuma:
Esses foram os dois elementos básicos e, a partir daí, pedi-lhes que pensassem em formas de dar mais liberdade ao jogador. Como trabalhamos em jogos da série The Legend of Zelda há vários anos, começámos a sentir que os fãs podiam deixar de a jogar se não pudessem pensar de forma independente e experimentar várias coisas sozinhos, em vez de seguirem um caminho predefinido.
Mesmo quando se trata de resolver quebra-cabeças num título da série The Legend of Zelda, sentir o entusiasmo de resolver quebra-cabeças sozinho, de uma forma única, torna-o um jogo "estilo Legend of Zelda". Por isso, temos de aumentar a liberdade do jogador para alcançar isso. Com esse intuito, pedi à Grezzo que usasse esses dois elementos como base para a jogabilidade e depois trabalhasse nessa maior liberdade.
Então, depois da grande reunião de ideias, foram definidas duas bases. Como se traduziu isso na jogabilidade?
Terada:
Explorámos em paralelo algumas formas diferentes de jogar. Numa abordagem, o Link podia copiar e colar vários objetos, como portas e castiçais, para criar masmorras originais. Durante essa fase exploratória, chamámos a essa ideia "edição de masmorras", porque os jogadores podiam criar a sua própria jogabilidade de The Legend of Zelda.
Aonuma:
Mostraram-me e disseram-me para experimentar. Quando joguei, comecei a pensar que, embora fosse divertido criar a nossa masmorra e deixar outras pessoas jogarem nela, também não seria mau usar objetos que pudessem ser copiados e colados no terreno do jogo, para que pudessem ser usados para combater inimigos.
Esse foi o início da utilização dos "ecos". A jogabilidade passou de criar masmorras para utilizar objetos copiados e colados como ferramentas para avançar na aventura.
Estou a ver. Então foi assim que surgiu a ideia de utilizar "ecos". Fizeram essa alteração na jogabilidade na fase inicial do desenvolvimento?
Aonuma:
Hum...
Sano:
Tínhamos criado o protótipo da ideia de editar masmorras há cerca de um ano.
Terada:
Tinha passado muito tempo.
Sano:
Virámos tudo do avesso passado um ano. (Risos.)
Aonuma:
Estavam todos a desenvolver o jogo com a criação de masmorras em mente, mas eu estava lá ao lado a pensar em algo diferente. (Risos.) Mas há uma razão para termos demorado um ano a virar tudo do avesso. Afinal de contas, só conseguimos perceber o potencial do desenvolvimento sólido das ideias quando vemos os seus elementos e como fluem, por isso, quis que as tentassem pôr em prática primeiro.
Senti que o elemento da edição de masmorras que me mostraram tinha potencial suficiente para fundar uma nova forma de jogar The Legend of Zelda se a jogabilidade fosse alterada para usar "ecos". Por isso, pensei que seria bom avançar nessa direção e que podia ser ainda mais interessante.
No entanto, havia uma preocupação. Embora as consolas tenham uma maior capacidade de memória hoje em dia, quanto mais coisas os jogadores podem copiar e colar, mais memória de jogo é usada. Tive muito receio de que isso provocasse falhas no jogo.
Mas não foi o Aonuma-san que, apesar dessa preocupação, acabou por tomar a decisão de virar tudo do avesso?
Aonuma:
Fui eu, de facto. (Risos.) Mas pensei que podíamos fazer algo mais interessante se fôssemos mais longe. Não sabia bem até onde podíamos ir, mas, no fim, foi incrível ver quantos ecos era possível criar no jogo. Deve ter sido difícil gerir a memória do jogo.
Sano:
Eu reparei desde o início que copiar coisas novas era muito divertido. O conceito da edição de masmorras envolvia copiar várias coisas durante a aventura no terreno do jogo e depois trazê-las de volta para criar uma masmorra num espaço dedicado.
Quando eu estava nessa aventura de ver coisas para copiar, reparei que, se copiasse algo que só existia na vista lateral para num sítio com vista de cima para baixo, funcionava bem. Nos jogos 2D, mesmo que um objeto pareça igual, é muitas vezes criado e utilizado de uma forma completamente diferente nessas duas perspetivas, mas a Grezzo criava um único objeto que funcionava em ambas.
O mesmo objeto podia ser usado em várias perspetivas?
Sano:
Sim, é o mesmo objeto, mas parece funcionar de forma diferente quando é visto de outro ângulo, e isso é interessante para nós. Por exemplo, em The Legend of Zelda: Link's Awakening, há um inimigo chamado Thwomp que cai de cima, esmaga as coisas em baixo e só aparece na perspetiva lateral.
Se o copiarmos e colarmos na perspetiva de cima para baixo, podemos largá-lo de cima e esmagar coisas em baixo ou, inversamente, podemos montar o Thwomp e usá-lo para subir.
Imagens captadas durante o desenvolvimento
Fiquei surpreendida ao ver que, embora as funções fossem as mesmas, podemos usá-las de maneiras novas mudando apenas a perspetiva.
Aonuma:
Isso foi incrivelmente divertido.
Sano:
Eu pensei para mim: "Uau, não sabia que isto era possível." Claro que criar masmorras era divertido, mas ser capaz de copiar vários objetos e de os usar em lugares diferentes era ainda mais divertido.
Os designers da Grezzo estavam cientes da combinação da vista lateral e da vista de cima para baixo mesmo quando criaram o protótipo da edição de masmorras?
Terada:
Depois de acabarmos de desenvolver o remake de The Legend of Zelda: Link's Awakening, gostámos muito do mundo do jogo, por isso, falámos com a Nintendo sobre a criação semelhante do conceito da edição de masmorras, cujo protótipo estávamos a desenvolver. Visto que o remake de The Legend of Zelda: Link's Awakening tinha áreas com perspetiva de cima para baixo e perspetiva lateral, toda a equipa da Grezzo supôs, desde o início, que iríamos criar perspetivas de cima para baixo e lateral neste título.
Contudo, The Legend of Zelda: Link's Awakening passa-se numa ilha com um mapa mais pequeno e era um remake, por isso, o que podia ser adicionado durante o desenvolvimento era limitado. Assim, neste jogo novo, criámos o protótipo com a ideia de expandir o que todos nós queríamos fazer.
Aonuma:
Quando encontramos um Thwomp num jogo de deslocação lateral, parece um retângulo fino, porque só se vê a parte da frente. No entanto, quando é visto de um ângulo diferente, parece um pedregulho gigante que faz um grande estrondo quando cai. A sua presença enquanto objeto é completamente diferente. Pensei que o contraste entre a perspetiva plana e a tridimensional daria mais variedade às expressões neste jogo. Por essa razão, há mais cenas de perspetiva lateral neste jogo do que em The Legend of Zelda: Link's Awakening.
Sano:
Mesmo que se use a mesma função, mudar a perspetiva pode ajudar a compreender melhor como a usar. Uma pergunta como "quão alto pode este objeto subir e descer?" é mais fácil de verificar com a perspetiva lateral, e "quão grande é este objeto?" tem uma resposta mais clara na perspetiva de cima para baixo.
À medida que avançávamos no desenvolvimento do jogo, sentíamos que as mudanças de perspetiva o tornavam duplamente gratificante.