O que é que aconteceu na PlatinumGames para te levar a trazer o projeto até à Nintendo pela segunda vez? Estou a partir do pressuposto de que não deve ter sido fácil para ti reescrever o plano.
É verdade. No que diz respeito à PlatinumGames, o projeto girava totalmente em torno das personagens e, então, interrompemo-lo durante algum tempo porque sabíamos que ia ser difícil caso não conseguíssemos a autorização da empresa. Kamiya até esteve a trabalhar noutro projeto durante uns tempos.
Ai sim?
Mas havia vários fatores relacionados com esse novo projeto que, eventualmente, nos levaram a deixá-lo em águas de bacalhau. Por isso, quando Kamiya e eu discutimos o que devíamos fazer a seguir, ele pressionou-me dizendo que queria mesmo fazer aquele outro projeto.
Bem, quer dizer, eu não consigo desencantar projetos uns atrás dos outros!
(risos)
Após termos revisto vários fatores, decidimos manter a jogabilidade que tínhamos proposto inicialmente e criámos uma demo num PC na qual substituímos as personagens existentes por super-heróis e trouxemo-la até à Nintendo.
Nessa altura já tinham imagens de personagem para os super-heróis que se tornaram as personagens principais finais?
Não, os gráficos que tínhamos nessa altura eram bastante diferentes.
Quando o projeto começou, as personagens eram mais parecidas como as de Viewtiful Joe11, como os super-heróis obscuros dos livros norte-americanos de banda desenhada. Gostava imenso desse tipo de arte e achei genuinamente que podíamos seguir esse caminho.11. Viewtiful Joe: Um jogo de ação de deslocação lateral lançado pela Capcom para a Nintendo GameCube no Japão em junho de 2003, e na Europa em outubro do mesmo ano. O jogo incluía a singular «VFX Action» que permitia que o utilizador controlasse o tempo e o espaço, bem como gráficos únicos ao estilo dos livros norte-americanos de banda desenhada.
Exato.
Como Matsushita-san adora jogos de ação, mostrei-lhe o plano e perguntei: «Este projeto vai ser muito interessante. Não queres trabalhar comigo nele?» E, imediatamente, ele disse algo como: «As imagens são demasiado obscuras. Os miúdos do ensino básico não vão achar graça.»
Respondeste logo isso, Matsushita-san?
Disse isso, é verdade. (risos) Estava convencido de que tínhamos de mudar esse aspeto. Mas não podia limitar-me a dizer: «Isto parece-se demasiado com um livro de banda desenhada obscura, por isso, não serve» ao tipo que já tinha feito um jogo nesse estilo, não é?!
Realmente, isso não era de bom tom! (risos)
Como tinha ouvido dizer que a malta da PlatinumGames era bastante exigente, tivemos imensas discussões dentro da empresa sobre como haveríamos de lhes transmitir a ideia e se não deveríamos antes dar prioridade ao conceito da PlatinumGames e avançar com isso.
Mas, no final, decidiu-se que teriam de alterar os gráficos para poderem alcançar o maior número possível de pessoas.
É verdade. E eu pensei: «Só temos de abrir o jogo e pedir-lhes.»
Como reagiste, Kamiya-san?
Para dizer a verdade, quando ouvi aquilo, pensei: «Já sabia que isto ia acontecer.» Eu próprio admiti que ia acabar por estar demasiado direcionado para um nicho de mercado se o mantivéssemos como estava. Mas não conseguia decidir-me em relação ao que tornaria o jogo melhor. Mas, depois, Inaba contou-me as sugestões da Nintendo…
(Virando-se para Kamiya-san) Dizes isso como se tivesses logo concordado com tudo, mas ainda discutimos um bom bocado, não foi?
Oh! Fiz queixinhas a Inaba, como um miúdo pequeno.
(risos)
E Inaba-san, que já conhece Kamiya-san há bastante tempo, viu isso e percebeu que aquilo era o calcanhar de Aquiles de Kamiya.
Mas o problema da personalidade de Kamiya é não haver grande diferença entre o seu estado normal e o estado de protestar por uma razão qualquer.
É difícil perceber em que estado está?
Exato. Ele começa a avançar com um projeto como «Então está bem. Se o grande e poderoso produtor diz que é assim, parece que não tenho grande escolha, não é?»
(risos)
Mas os gráficos que acabámos por receber depois de lhos termos dado para que os alterassem eram um pouco diferentes daquilo que tínhamos imaginado. É mesmo à Kamiya-san não se limitar a dizer: «Eu mudei-os tal e qual me pediste.»
O conceito «figura realista, brinquedos realistas» nasceu aí. Tinha um aspeto espalhafatoso mas realista ao mesmo tempo.
Tem uma singularidade que não se vê com frequência e tem a vantagem de ser alegre e espalhafatoso.
Ainda tem o cunho distintivo de Kamiya-san, mas a maioria da obscuridade foi removida. Eu acho que conseguiram alcançar um ótimo equilíbrio.
Nessa altura, já só faltava fazer o jogo propriamente dito, certo? Afinal de contas, a estrutura básica do jogo já estava claramente definida no plano do projeto.
É verdade. Tal como referimos antes, os alicerces do jogo, que já usavam o Unite Morph , não mudaram muito desde os seus primórdios. O jogador ou a jogadora traz consigo um exército de super-heróis e pode usar o Unite Morph para transformar o exército numa só personagem gigantesca e usá-la para resolver problemas no mapa. Há variadíssimos tipos de Unite Morph e tu decides como certo problema deve ser resolvido à medida que vais jogando. Podes usar e selecionar todos os tipos de armas possíveis.
Então, já tinham isso tudo decidido.
Sim. Na Nintendo, o primeiro passo que quisemos dar foi planear todas as funcionalidades do jogo, mas, no início, não nos mostraram muita informação. Como Kamiya-san estava mais interessado em construir o mundo do jogo, não parava de ter ideias e de dizer: «Quero fazer isto! Quero fazer aquilo!»
Ah, certo. Quando me reuni contigo naquela altura, Yamagami-san, lembro-me de te ter perguntado mais do que uma vez qual era o tipo de sentimento que a jogabilidade transmitia.
Exato. Nós sabíamos que estilo artístico estava a ser seguido e como decorreria a jogabilidade, mas o único aspeto que estava a avançar era a criação do mundo do jogo e nós não sabíamos pormenores sobre o que seria divertido, nem sobre os outros aspetos. Por isso, comecei a ficar preocupado. Essa situação ainda se arrastou durante bastante tempo.
Em relação a tudo isso, foi só em 2013 que a jogabilidade ficou totalmente decidida?
Por volta da E312 do ano passado, já se podia jogá-lo normalmente. Mas só este ano é que conseguimos definir os detalhes.12. A E3 é a Electronic Entertainment Expo, uma exposição anual de videojogos que se realiza em Los Angeles. A E3 2012 foi um evento de três dias que decorreu entre 5 e 7 de junho de 2012.
É verdade. Sinto que estivemos sempre a mudar as coisas devagarinho. De cada vez que um prazo se aproximava, dizíamos: «Não podemos deixá-lo como está!» e fazíamos mais umas pequenas alterações.
Os prazos são uma fonte de energia para ti, Kamiya-san?
Sim. Só quando chego ao ponto de ranger os dentes e de pensar: «Isto está péssimo!» é que consigo realmente pensar nas coisas.
(risos)
(virando-se para Kamiya-san) Talvez devesse mandar alguém para te arrancar os dentes?
(risos)
Mas a verdade é que não estava satisfeito com o jogo na altura da E3 do ano passado. Ainda não era realmente divertido. Tínhamos uma arte sólida e a singularidade de o jogo ter muitas personagens. Mas ainda não tínhamos a parte mais importante, isto é, como seria a jogabilidade.
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