2. “No caixote do lixo”

Iwata:

Minami-san, juntaste-te à Capcom como designer, mas um ano mais tarde começaste a trabalhar no planeamento. Eras conhecido como um “homem de planos”?

Minami:

Surpreende-me que saibas disso! (risos)

Inaba:

Ainda hoje, na PlatinumGames, chamamo-lo de “homem dos planos.”

Iwata:

As funções de um homem dos planos requer duas atitudes: uma paixão intensa por alguma coisa que quer fazer e, por outro lado, uma cabeça fria para tomar decisões considerando a forma como outras pessoas o verão.

Minami:

Exato.

Iwata:

Assumiste essas funções imediatamente?

Minami:

Não. Inicialmente, não.

Iwata:

Bem, gostaria de ver alguém a conseguir fazer isso logo desde o início! (risos)

Minami:

Inicialmente, pensava num projeto e começava a duvidar de mim mesmo. Pensava: “Será que isto é bom?” Pensava o mais que podia, até altas horas da noite, mas, no final, não sabia para onde ir. Depois, quando apresentava a um programador sénior uma proposta para um projeto, ele dizia que achava aquilo desinteressante e deitava-a no lixo, literalmente. Ia parar ao caixote do lixo – plop! – ali mesmo, diante dos meus olhos!

Iwata Asks
Iwata:

Que cruel.

Minami:

Era mesmo. Mas naquela altura, era assim.

Iwata:

Não podias fazer nada a menos que o programador desse o seu aval.

Minami:

Exatamente. Nem sequer podias pedir a alguém que fizesse imagens para alguma coisa. Quando comecei a trabalhar como “homem dos planos”, pensei que as pessoas à minha volta iriam cooperar comigo no sentido de concretizar as minhas ideias. Mas não foi, de todo, assim!

Iwata:

Deve dar-se o caso de se não consegues convencer os que estão mais próximos de ti, então não irás, certamente, conquistar os consumidores.

Minami:

Tens toda a razão. Pensavam “Porque é que os clientes considerarão isto divertido se só nós próprios não o consideramos?”

Iwata:

O facto de trabalhares com essas pessoas contribuiu para aperfeiçoares as tuas capacidades de planeamento.

Minami:

Sim. Era uma empresa bastante competitiva, pelo que tinha aquela atmosfera de “equipa desportiva”. Mas mesmo agora… (olhando para o Inaba-san) o que faço é semelhante! (risos)

Inaba:

Sim, exatamente. (risos)

Iwata:

(risos) É uma tradição que continua! Mas embora tenha sido duro para ti nessa altura, isso não é melhor do que fazer alguma coisa que depois o público reprovará?

Iwata Asks
Minami:

Sim. Mas quando era novo, tinha dificuldade em entender isso. (risos)

Iwata:

Certo. Quando se é novo, simplesmente não se consegue entender essas coisas imediatamente. (risos)

Minami:

Então, sempre pensei que era bastante cruel.

Iwata:

Como o suportaste?

Minami:

Pensei em desistir várias vezes. Mas em todas essas vezes pensava no que iria fazer depois de me demitir e ficava num impasse. Nessas alturas ia para casa, completamente exausto, e jogava!

Iwata:

Os videojogos estavam a fazer-te a vida negra, mas, mesmo assim, ias para casa jogá-los.

Minami:

Perguntava-me muitas vezes porque seria. Os videojogos são divertidos e contêm o tipo de entretenimento que quero. Depois, um dia apercebi-me de que só algumas pessoas tinham a sorte de poder trabalhar no desenvolvimento de algo em que podia estar absorvido, já que jogava videojogos mesmo estando terrivelmente cansado.

Iwata:

Sim, temos essa sorte.

Minami:

Sim. Então pensei: “Vou ficar mais um pouco.”

Iwata:

Os videojogos são, de facto, uma coisa que muitas pessoas jogam de forma séria e com paixão, pelo que somos uns sortudos por podermos criar essa oportunidade.

Minami:

Sim. Acabei por aperceber-me disso e persisti, mas mesmo depois disso, continuei a ir para casa frustrado muitas vezes. (risos)

Iwata:

O que deu origem ao teu progresso enquanto planeador mesmo depois de toda essa frustração inicial?

Minami:

O jogo Super Ghouls’n Ghosts5. A Super NES foi lançada e o primeiro título da Capcom lançado foi Final Fight6, que foi outro transporte de um jogo de salões de jogos, por isso trabalhei nele. Demos o nosso máximo para o acabarmos num período de tempo tão curto. Depois o meu superior disse que podia tirar duas semanas, o que era raro.5. Super Ghouls’n Ghosts: Um jogo de ação lançado pela Capcom para a Super NES em dezembro de 1992.6. Final Fight: Um jogo de ação disponível nos salões de jogos em 1989. A versão para a Super NES foi lançada em dezembro de 1992.

Iwata:

Não era normal que o teu superior dissesse uma coisa dessas?

Minami:

Às vezes dizia que podia tirar dois dias, no sábado e no domingo! (risos)

Iwata:

Não achas isso suspeito? (risos) Ouvi dizer que na Capcom existe uma tradição em que um superior leva a sua equipa a jantar fora quando planeia envolvê-la num projeto desafiante.

Minami:

Então tirei duas semanas, regressei ao trabalho e ele disse: “Estamos a fazer o Super Ghouls’n Ghosts, mas sabes que não está a avançar, não sabes?”

Iwata:

O desenvolvimento tinha abrandado.

Minami:

Certo. O primeiro nível parecia terminado, mas enquanto jogo, simplesmente não havia adquirido forma. Ele disse-me para o fazer. Depois, durante cerca de dois anos, trabalhei nele quase sem ir a casa.

Iwata:

Então depois da tua recompensa de duas semanas de férias, seguiram-se cerca de dois anos de provações.

Minami:

Sim! (risos) E mesmo quando o prazo estava a aproximar-se, continuámos a refazer o ROM mestre.

Iwata:

Passamos por um processo de controlo de qualidade que implica verificar se o título funciona devidamente na consola de qualquer lote de fabrico. E isso falhou várias vezes. Também passei por isso, é mesmo difícil! (risos)

Minami:

Foi mesmo! Causámos alguns problemas à Nintendo, mas, no final, levámo-lo diretamente para a fábrica e, de alguma forma, conseguimos lançá-lo. O Super Ghouls’n Ghosts deu-nos, realmente, muitas dores de cabeça, mas após o lançamento, as críticas foram extremamente positivas.

Iwata Asks
Iwata:

O vosso trabalho árduo acabou por compensar.

Minami:

Sim. Eu estava felicíssimo. Quando integrei o projeto, a meio do desenvolvimento, pensei que me tinham impingido uma tarefa sobre-humana, mas depois do lançamento e das críticas positivas, fiquei extremamente agradecido ao meu superior por mo ter atribuído. Estava mesmo contente.

Iwata:

Quando um projeto se deparava com problemas e o teu superior te pedia para fazeres algo em relação a isso, era porque ele confiava em ti. Quando o desenvolvimento terminou, apercebeste-te pela primeira vez que te tinha confiado uma tarefa difícil.

Minami:

Exato. A experiência de serem os jogadores a avaliar o meu trabalho foi um grande ponto de viragem para mim. Desde aí que penso que vou continuar a fazer este trabalho até ao fim da minha vida!