Havia outra vantagem em usar dois ecrãs.
Qual?
Ao mostrar imagens de personagens com uma resolução elevada no ecrã superior, o jogador podia imaginar o resto. É por isso que, durante o jogo, a imagem melhor da personagem que se via no ecrã superior era a que ficava na cabeça do jogador, mesmo se os gráficos do ecrã inferior (onde efectivamente se jogava) fossem pouco trabalhados.
Logo no início, a única coisa que podíamos mostrar no ecrã inferior era um pugilista pequenino porque, quando aumentávamos a imagem, esta parecia demasiado indefinida. Mas queríamos mostrar um combate intenso, por isso tentámos fazer um zoom de 1,5. Depois de o fazer, foi estranhamente difícil distingui-los. Estava a trabalhar com Takeda-san para criar mecanismos como estes. A experiência da altura...
Tornou-se importante para a tua vida enquanto designer de jogos.
Exactamente.
Já agora, porque estavas envolvido na criação do Punch-Out!! original?
Na altura fazia parte do Departamento de Planeamento, que estava responsável pelo design.
Que tipo de trabalho era feito?
Eu desenhava para toda a empresa. Fazia anúncios, design de jogos e ajudava qualquer área da empresa que precisasse de trabalho de design. Trabalhei em todo o lado, por isso era como um membro da equipa de apoio.
Portanto, quando um dos departamentos precisasse de criar imagens eras chamado e tratavas do assunto.
Na altura, Takeda-san tinha estado a trabalhar como designer de jogos no Departamento de Investigação e Desenvolvimento 3.
Departamento de Investigação e Desenvolvimento 3... Esse é o antigo Departamento de Investigação e Desenvolvimento Integrados.
Isso mesmo. O Departamento de Investigação e Desenvolvimento 3 criou o jogo todo, desde desenhar o substrato a criar o software. Mas não tinha nenhum desenhador na equipa.
E foi por isso que te chamaram.
Bem, na altura era ainda uma empresa pequena. Estava no mesmo piso que a equipa de Takeda-san, por isso andava sempre de um lado para o outro.
Foi o primeiro projecto em que trabalharam juntos?
Não, tenho a impressão que foi o jogo Sheriff6, não foi? 6 Sheriff: um shooter onde o jogador tem de derrotar dezasseis desperados. O jogo Wario Ware Inc.: Minigame Mania (Game Boy Advance) incluiu o título como minijogo.
Estás a falar do jogo arcade que fizemos em 1979?
Então a primeira vez que trabalharam juntos foi no Sheriff! Jogava muito esse jogo no meu tempo. (risos)
Eu também... As pessoas até se reuniam à minha volta nos arcades de Quioto. (risos)
Ai sim? Não tenho dúvida de que as tuas belas demonstrações eram um chamariz. (risos)
Quando dava por mim, já tinha um grupo de pessoas à minha volta a observar-me e ficava muito surpreendido. (risos)
(gargalhadas)
Quando fizemos o Sheriff, desenhei imagens em píxeis com outro designer e começámos à procura de materiais para a carapaça da máquina. Falámos muito em querer construir uma nova unidade, como o mundo nunca antes tinha visto. Por isso até fomos a uma empresa que fazia os interiores dos aviões.
Os interiores dos aviões?
Essa empresa conseguia fazer impressões de anéis de madeira de modo a parecer madeira natural. Por isso, comprámos uns autocolantes e pusemo-los na unidade para dar um ar de taberna americana antiga. De qualquer modo, na altura, estava a fazer todas as ilustrações – desde o conteúdo do jogo à carapaça da máquina.
Estudaste design industrial, por isso deves tê-lo feito bem.
Gostei de o fazer. Depois disso, Takeda-san fez um shooter chamado Space Firebird7 que foi lançado logo a seguir, e desenhei as imagens das personagens. Também fizemos o Popeye8 juntos, um ano depois de Donkey Kong. 7 Space Firebird: Um jogo arcade tipo shooter lançado em 1980 onde o jogador tem de abater uma "fénix" que voa no espaço. 8 Popeye: Um jogo arcade de acção lançado em 1982 onde o jogador controla a popular personagem de desenhos animados Popeye. Foi lançada igualmente uma versão para a NES.
Então é por isso que Miyamoto-san se viu naturalmente envolvido em Punch-Out!!. Já agora, como começou o design de jogo neste caso?
Inicialmente, pensei num aparelho realista de input.
A primeira vez que ouvi isto, fiquei muito surpreendido. Takeda-san dizia que o boxe devia ser jogado com luvas calçadas e que gostaria de usar uma interface como uma luva de boxe. Como jogo videojogos, disse-lhe que não gostava muito de interfaces ambíguas ou difíceis de compreender. Foi por isso que decidimos usar um joystick e botões para que fosse o mais simples possível de perceber. Depois criámos uma estrutura para o jogo e o padrão das imagens. Mas, nessa altura, o interesse de Takeda-san já tinha tomado uma nova direcção. Começou a focar-se nos detalhes do jogo. Dizia coisas como: a fraqueza deste adversário é o queixo, por isso vamos chamá-lo "Glass Joe" . Já nem sequer era designer. (risos)
(risos)
Há um adversário de Itália chamado Pizza Pasta. Também foi Takeda-san que o baptizou?
Isso queria dizer que o adversário se colava e era difícil de separar.
Tal como o queijo da pizza, que é peganhento. (risos) Bem tento, mas não consigo acreditar que tu, um engenheiro que pensa em tudo com uma lógica extraordinária, te tenhas lembrado de um nome como Pizza Pasta. (risos)
É que, na verdade, Takeda-san é uma pessoa de espírito aberto. (risos)
Glass Joe /Von Kaiser/King Hippo/Bald Bull (Estas ilustrações são das personagens que aparecem na versão de Punch-Out!! para a NES)
O mercado de jogos arcade norte-americano era enorme na altura.
Era mesmo, por isso o processo envolvia criar o jogo, ao mesmo tempo que mantínhamos contacto frequente com o pessoal da NOA (Nintendo of America). Na altura, a NOA só trabalhava nas áreas de marketing e vendas, por isso achei que eram capazes de estar interessados em participar no desenvolvimento.
E isso aconteceu pouco tempo depois de a NOA ser fundada, não foi?
Agora já fazem outras coisas, mas na altura pedi aos novatos para fazerem as vozes, por exemplo a do árbitro ou a do relato.
Na época ainda não existia a ideia de usar actores de voz em videojogos.
E, além disso, os Estados Unidos eram o centro do boxe mundial, por isso queria certificar-me de que tinha a participação do pessoal da NOA durante o desenvolvimento do jogo.
Enviaste material ainda em desenvolvimento para os Estados Unidos para obter opiniões?
Na altura não existia o correio electrónico e não era possível enviar o substrato de um jogo muito facilmente.
O material tinha de passar pela alfândega.
Por isso, enviava as imagens e as especificações por fax.
Comparando como as coisas são feitas hoje em dia, parece dar muito mais trabalho.
Depois de acabar de fazer o jogo, já não sei se foi em 1983 ou 1984, mostrámo-lo num evento em Nova Orleães e convidámos o campeão mundial de pesos pesados da altura, Larry Holmes9. Numa apresentação, ele fez uma demonstração do jogo em frente ao público. 9 Larry Holmes: antigo campeão mundial de pesos pesados que alcançou o estrelato após Muhammad Ali se ter reformado.
Fizeste uma demonstração do jogo?
Não fui eu, foi o Larry Holmes. (risos) Pedi que assinasse uma luva de boxe e expu-la na sala do Departamento de Investigação e Desenvolvimento 3.
Trouxeste a luva hoje?
Não, não a trouxe comigo, mas tenho a certeza que está bem guardadinha algures. (risos)
Luva assinada por Larry Holmes
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