4. Uma colaboração extraordinária a três

Iwata:

Como é que defines a relação entre Sakamoto-san e Kitaura-san, Hayashi-san?

Hayashi:

Bem, enquanto estavam a explicar os movimentos nos storyboards, por exemplo, às vezes surgia uma referência a um filme antigo, sobre um monstro assustador, que apenas eles os dois compreendiam.

Iwata:

Então, estas referências não te dizem nada, vindas de uma geração diferente?

Hayashi:

Sim, é verdade (risos). Eles diziam coisas do tipo: “Esta parte é igual ao Gyaosu.” E eu não fazia ideia do que queriam dizer com isso.

Iwata:

Ah, Gyaosu, hum? (risos)

Kitaura:

Só nós os dois é que compreendíamos.

Iwata:

Na verdade, eu também faço parte da geração que conhece o Gyaosu... (risos)

Todos:

(risos)

Sakamoto:

Tivemos de responder a perguntas tão básicas como “O que é Gyaosu?”7. 7 Gyaosu era um monstro que apareceu em filmes produzidos pela Daiei Motion Picture Company. Apareceu pela primeira vez em Daikaijū Kuchu Kessan: Gamera tai Gyaosu, que foi lançado no Japão, em 1967.

Kitaura:

Mesmo assim, continuo a acreditar que Hayashi-san é o mais adulto de nós os três. Ele também é muito fixe.

Sakamoto:

Em contraste, eu sou um homem de uma paixão ardente, mas ando sempre a correr em círculos. (risos) Bem, embora não tenhamos sido apenas nós os três a trabalhar neste projecto, fiquei sinceramente com a sensação de que as nossas personalidades e características individuais estavam coordenadas de uma forma muito confortável.

Iwata Asks
Iwata:

Vou, então, fazer esta pergunta ao tipo fixe. Hayashi-san, durante o desenvolvimento de Metroid: Other M, quando é que sentiste pela primeira vez “Uau, isto é incrível”?

Hayashi:

Esse tipo de reacção surgiu nos momentos em que parecia que nós tínhamos acabado de colocar as diferentes peças de um enorme puzzle no sítio certo. Durante a fase inicial de desenvolvimento, as partes de acção e as partes dos filmes foram criadas separadamente, e havia muita ansiedade em ver se as duas partes ficariam bem interligadas. Perto do final de 2008, juntámos o início do jogo. De facto, tudo encaixou de uma forma perfeita.

Iwata:

A acção e os filmes interligaram-se de uma forma perfeitamente contínua, não é verdade?

Hayashi:

Sim, é verdade. Quando vi isso, senti que estava a ver um pouco do tal “jogo de acção que conta uma história”, de que Sakamoto-san estava sempre a falar, e pensei: “Isto pode mesmo funcionar”.

Iwata:

Então, e tu, Kitaura-san?

Kitaura:

Aconteceu-me exactamente o mesmo que a Hayashi-san. As partes de acção foram criadas do lado de Hayashi-san e os filmes foram criados, separadamente, do meu lado. Sakamoto-san podia ver ambos os lados de uma forma objectiva, e tenho a certeza de que ele tinha ideia de como iriam ficar, depois de serem interligados, mas, quando eu finalmente os vi combinados, pensei: “Nunca foi criado nada parecido com isto”.

Iwata:

Apesar de teres criado muitos storyboards, e mesmo sabendo sempre qual seria a próxima cena, enquanto criavas a computação gráfica, foi uma surpresa para ti ver as duas partes combinadas, Kitaura-san?

Kitaura:

Sim, fiquei realmente surpreendido.

Sakamoto:

Acho que o facto de termos pedido a Kitaura-san que fosse responsável pela produção do jogo todo, e não só dos filmes, foi um factor importante para fazer com que a acção e os filmes encaixassem como peças de um puzzle.

Hayashi:

Eu acho o mesmo, porque Kitaura-san estava sempre a insistir: “Temos de ter a mesma Samus nos filmes e nas partes de acção”.

Kitaura:

Bem, só existe uma Samus no mundo. Fazer com que Samus ficasse realmente muito bem numa parte do jogo teria sido inútil se, no final, houvesse uma “Samus nos filmes” e uma “Samus na acção”. Eu não queria que o jogador sentisse que havia alguma inconsistência, por isso, eu mesmo joguei as partes jogáveis várias vezes. Obter uma “continuidade perfeita” foi um dos objectivos deste projecto, mas não tinha apenas que ver com a transição da acção para os filmes, eu também acreditava que era muito importante tornar os sentimentos do jogador contínuos.

Iwata Asks
Iwata:

Tornar os sentimentos do jogador contínuos?

Kitaura:

Sim. Achei que era importante que o jogador desfrutasse da história e da acção, sem existirem interrupções na forma como estas duas partes eram sentidas.

Iwata:

O engraçado é que tanto Kitaura-san como Hayashi-san dizem que sentiram uma reacção muito positiva, quando as partes do jogo e as partes dos filmes foram interligadas. O que achas disto, Sakamoto-san?

Sakamoto:

A estrutura de Metroid: Other M é, basicamente, a de um jogo de acção, mas eu achei que, se fôssemos capazes de fundir com êxito a acção e a história, poderíamos criar “um jogo de acção que será tal como uma aventura”, algo que nunca foi visto antes.

Iwata:

Sakamoto-san, trabalhaste no passado em jogos de aventura em texto, como

Video: Famicom Tantei Club

Como é que defines a relação entre Sakamoto-san e Kitaura-san, Hayashi-san?
Famicom Tantei Club 8, não é verdade? 8 Famicom Tantei Club era uma série de jogos de aventura para o Family Computer Disk System. O primeiro jogo da série, Famicom Tantei Club: Kieta Kokeisha,foi lançado no Japão, em Abril de 1988 (estava dividido em duas partes, tendo a segunda sido lançada em Junho de 1988).

Sakamoto:

Sim, é verdade. Quando pensei em criar “um jogo de acção que conta uma história”, senti que podia pôr em prática essa experiência, embora a experiência de criar jogos de aventura baseados em texto pareça completamente irrelevante, à primeira vista. Em jogos de aventura, o jogador selecciona e executa comandos como “examinar” e “mover”, durante os intervalos na história. Num jogo de acção, a selecção destes comandos é substituída pelo jogador a desempenhar acções, como lutar contra inimigos e movimentar a sua personagem.

Iwata:

Queres dizer que os controlos, como saltar e disparar contra inimigos, são equivalentes aos comandos nos jogos de aventura?

Sakamoto:

É isso mesmo. Acho que o simples facto de ele próprio conseguir mover uma personagem oferece ao jogador um sentido de envolvimento no jogo completamente diferente, em comparação com a selecção básica de comandos. Filmes da história que começam em pontos importantes expandem ainda mais o jogo e apresentam novos puzzles ao jogador, motivando-o a avançar. Com o jogador envolvido no enredo da história, e a ser arrastado pelas emoções de Samus, o jogo volta à parte da acção. É esta a dinâmica do jogo.

Iwata Asks
Iwata:

Estou a ver. Então, os filmes não são simples intervalos na acção ou nas decorações de produção. O objectivo é o jogador desfrutar do jogo como se este fosse uma corrente inquebrável, com as partes de acção e as partes dos filmes a oferecerem as mesmas sensações. Isto permite aos jogador desfrutar de uma experiência de jogo completamente nova.

Sakamoto:

Acho que, desta vez, fomos capazes de criar um Metroid com uma boa história. Eu gostaria realmente que um grande número de jogadores desfrutasse deste “jogo de acção que conta uma história”. Esta também é a razão para os controlos simples. Eu queria que o maior número possível de pessoas experimentasse este jogo.

Iwata:

Muito bem. Finalmente, têm alguma mensagem para as pessoas que têm esperado ansiosamente por este jogo? Vamos começar por ti, Kitaura-san.

Kitaura:

Claro. Nós quisemos implementar o mais alto nível de qualidade possível em computação gráfica neste jogo, e demos realmente o nosso melhor para o conseguir, mas também gostaria que os jogadores prestassem atenção à actriz que deu voz a Samus. Samus é uma mulher que é fraca a lidar com os problemas da vida. Como resultado, escolhemos uma actriz de dobragem, não por ser tecnicamente eficiente, mas porque conseguia falar naturalmente, usando as suas próprias palavras.

Sakamoto:

Então, a essência dela é parecida com a de Samus.

Kitaura:

Sim, é isso mesmo. Além disso, em relação ao som no jogo, contratámos o compositor Haishima-san, que conseguiu contar a história com melodias9. Ele criou música para cada cena, o que, na minha opinião, foi uma ajuda poderosa para conseguirmos retratar os sentimentos e as emoções de Samus. E acho que tu também ficaste impressionado com as músicas, Sakamoto-san. 9 Kuniaki Haishima é um compositor que trabalha numa grande variedade de áreas, incluindo filmes, novelas de TV, animações, videojogos e anúncios publicitários para TV.

Sakamoto:

Claro que sim.

Kitaura:

Além do mais, ao completarmos este jogo, há um grande sentimento de concretização. E acho que é um jogo que pode ser profundamente comovente, por isso, espero que os jogadores desfrutem desta experiência até ao fim.

Iwata Asks
Iwata:

Muito obrigado. Então, e tu, Hayashi-san?

Hayashi:

Para este projecto, a Team NINJA criou o corpo de Samus, mas foi Sakamoto-san que fez o sangue fluir nas veias dela, e foi Kitaura-san que criou a alma dela. Por isso, embora seja um jogo de acção, acho que tem uma história genuína, e acho que tem o poder de abalar as emoções. Este jogo levou três anos a ser criado, por isso, é um projecto muito importante para mim, mas, tal como disse antes, este é “um jogo NES com a tecnologia mais recente “. Por isso, quero realmente que os jogadores, mesmo aqueles que se têm afastado dos jogos de acção, sintam: “Os jogos de acção conseguem ser tão divertidos!”.

Iwata:

Por outras palavras, queres que percebam que vocês criaram um jogo verdadeiramente emocionante, utilizando a tecnologia mais recente e controlos NES simples, não é verdade?

Hayashi:

Sim, é isso mesmo. Também ficaria muito contente se os jogadores gostassem que os jogos de acção no futuro tivessem estas características.

Iwata Asks
Iwata:

Muito bem. E, finalmente, Sakamoto-san.

Sakamoto:

Eu acho que vai haver pessoas a espalhar suposições negativas sobre este jogo, como “Para quê um Metroid cheio de filmes?” ou “Deve ser mais um jogo para jogadores veteranos”. No entanto, colocando a pergunta “Não somos capazes de contentar um maior número de pessoas com este estilo de Metroid?”, eu acho realmente que nos desafiámos a nós próprios com este jogo. Acho que foi graças à equipa incrível com que trabalhámos que fomos capazes de tornar tudo isto realidade. Sinto-me extremamente grato por tudo.

Iwata Asks
Iwata:

Hoje em dia, ouço falar muito no conceito “colaboração”, mas eu acho que existem dois tipos de colaboração: uma adição simples e uma multiplicação. Eu acho que este projecto funcionou muito bem como um exemplo de “multiplicação”. Foi isso que senti quando joguei o jogo pela primeira vez e, ao falar hoje com estas duas pessoas, sinto-o cada vez mais. Tiveste muita sorte, não tiveste, Sakamoto-san?

Sakamoto:

Sem dúvida, tive mesmo muita sorte.

Iwata:

Apercebi-me, mais uma vez, de que a equipa que criou este projecto pode chamar-se, sem qualquer vergonha, “Trio Extraordinário”. Espero que muitas pessoas tenham a oportunidade de verificar pessoalmente os resultados que foram conseguidos com este projecto, “multiplicando” o talento de três pessoas, de três áreas diferentes.

Iwata Asks
Sakamoto:

Eu acho que os membros desta colaboração foram escolhidos pela própria Samus. Simpatizámos com ela e ajudámos gradualmente a redefini-la. Como resultado, Samus está mais bonita que nunca.

Iwata:

Então, parece que mais pessoas se vão apaixonar por Samus, certo?

Sakamoto:

Sim, por isso... (sério) acho que Samus vai ser uma rapariga muito feliz.