Ouvimos que o número de e-mails enviados e recebidos foi superior a dez mil mas, enquanto muitas pessoas ficariam absolutamente exaustas depois de enviar esse número de e-mails, outras pessoas ficariam bem. Apesar de ter a certeza de que estás cansado, Nagasawa-san, ao encontrar-me contigo hoje, não fico com a sensação de que tenhas ficado farto dessa troca de dez mil e-mails. Porquê?
Para este projecto, Sakamoto-san deu o nome “Project M” à equipa de produção. Graças a isto, foi possível comunicarmos como iguais, como membros da equipa de desenvolvimento de Metroid: Other M, isto apesar do facto de trabalharmos para companhias diferentes. Acho que foi por causa disto que a comunicação não se tornou cansativa.
Saito-san disse-nos, anteriormente, que pensou que ia odiar trabalhar num sistema de hierarquia vertical, mas que isso acabou por ser uma preocupação sem motivo. Sentiste o mesmo, Nagasawa-san?
Sim, senti. A relação que houve não foi uma relação em que algumas pessoas davam ordens e as outras pessoas recebiam ordens. Os membros das diferentes companhias trabalharam como uma equipa, e foi por isso que foi tão fácil para nós darmos também as nossas opiniões.
O facto de não ter existido uma relação do tipo “comandantes e comandados” significa que aquelas coisas que alguém não tinha eram fornecidas pelos parceiros na equipa e vice-versa. Isto significa que os membros da equipa desenvolveram respeito uns pelos outros. Com uma relação assim, baseada no respeito mútuo, é mais fácil trocar propostas e opiniões uns com os outros, não é?
Sim, é. O resultado foi que nunca houve absolutamente nada do tipo “limita-te a fazer o que te mandaram”, e houve um ambiente onde se podia falar livremente sempre que se quisesse. Acho que todos tiveram a capacidade de aceitar as opiniões dos outros e, por isso, nunca existiu stress durante as trocas de opiniões.
O facto de se poder dizer tudo o que se quisesse também se reflectiu na duração das reuniões. Tínhamos reuniões cara-a-cara sempre que surgia alguma coisa.
Eu também disse: “A comunicação cara-a-cara é melhor, por isso, se houver necessidade, não hesitem em convocar reuniões.” Não existem muitas coisas para as quais é melhor não fazer uma reunião do que fazê-la. É claro que, nos dias de hoje, muitas coisas podem ser tratadas electronicamente.
Reuniões com a duração de seis, sete ou oito horas tornaram-se relativamente comuns.
Houve vezes em que comi duas vezes numa única reunião! (risos)
Comer duas vezes, então... Duas refeições? Incrível.
Eu almoçava durante uma reunião. Depois, jantava. Houve vezes em que até tomei o pequeno-almoço do dia seguinte. (risos)
Três refeições! (risos)
Mas, mesmo grandes reuniões como essas não pareciam duras, muito pelo contrário, estavam cheias de momentos agradáveis.
A equipa deste projecto era constituída por três partes: a equipa de Metroid, da Nintendo, a Team NINJA e o grupo de cinematografia, que incluía Nagasawa-san, Kitaura-san e outros. Isto pode parecer uma combinação estranha para quem está de fora, mas, com um grande volume de comunicações, foram capazes de trocar ideias e informações de forma fluida. Contudo, durante o desenvolvimento do jogo em si, não me parece possível que tudo tenha corrido bem e que não tenha existido nada além de momentos agradáveis. Gostaria de perguntar sobre as vezes em que pensaste: “Isto está a ser realmente difícil.” Como foi para ti, que estavas encarregado do som, Koike-san?
O desenvolvimento teve lugar durante um longo período de tempo, por isso, houve vários momentos difíceis. Por exemplo, a primeira coisa que disponibilizámos ao público, através do website deste projecto, foi uma peça musical tocada em piano . Essa peça nasceu numa tarde em que recebi uma mensagem de Sakamoto-san, que dizia: “Quero fazer uma peça de música para piano.” Depois de eu ter respondido “existe uma pessoa na minha equipa que sabe tocar piano”, decidimos criar a peça. Foi então que lhe perguntei: “Já agora, qual é o prazo final?” Ele respondeu: “Hoje.”
Isso não é nada razoável! (risos)
(risos)
Tornou-se num desses “momentos difíceis”, sem dúvida. Assim, pusemos o nosso colega de equipa/pianista a tocar para nós. Criámos a primeira parte e deixámos que Sakamoto-san a ouvisse, antes de continuarmos a fazer fosse o que fosse..
Sakamoto-san estava em Quioto, nessa altura?
Sim, estava. Por isso, enviámos a música por e-mail. Claro que Sakamoto-san é um bocado obsessivo, por isso, a resposta dele depois de ouvir foi: “Esta parte está mal.” Nós refizemo-la e voltámos a enviá-la para ele, que respondeu: “Esta parte também está mal.” Estas trocas continuaram, uma após outra, até às oito da noite. Até o pianista começou a dizer: “Não consigo perceber!”
Então, ele estava prestes a admitir a derrota?
Sim, por isso, decidi juntar-me a ele e ajudá-lo. Tentámos fazê-la com dois acordes, depois com um e assim sucessivamente, sistematicamente tornando a peça cada vez mais simples. No fim, pedimos a Sakamoto-san que a ouvisse. Ele disse: “Está realmente boa. Estou comovido… Estou quase a chorar.” Quando o ouvi dizer isto, fiquei incrivelmente feliz. Apesar de ter sido apenas um dia de trabalho, tinha sido um dia muito difícil. E depois, de repente, tudo estava bem...
Então, provaste o Inferno e o Céu num só dia, parece-me.
Oh, provei-os sim, isso é certo! (risos) Mas a história não termina aqui. Depois de ter terminado tudo o que havia para esse dia e de ter chegado a casa, recebi um telefonema de Sakamoto-san. E, quando eu já estava a pensar “porque será que ele me está a telefonar?”, Sakamoto-san disse: “Hoje ouvi uma excelente peça musical. Obrigado.”
Ah, Sakamoto-san ficou comovido a esse ponto.Passemos ao planeador, Otsuka-san. Contaste-nos anteriormente como Sakamoto-san não media as palavras, ao mostrar-te as flores que desabrochavam no teu jardim, e como não tinhas conseguido dormir nessa noite. À parte destes, por que outros tempos difíceis passaste?
Como podes imaginar, ligar as partes do jogo com as partes cinematográficas de uma forma fluida pode ser muito desafiante. Ligar o jogo com a cinematografia parece simples. Mas, quando nos encontrámos pela primeira vez com Sakamoto-san, apercebi-me de que se só as ligássemos de uma forma normal, ele não iria ficar nem um pouco satisfeito.
Então, para ligar as partes de jogo com as partes cinematográficas com o nível que era desejado, houve coisas que tiveram de refazer do zero, houve outras, suplementares, que não tinham planeado fazer, mas que tiveram de fazer, e não só. Foi necessário fazer uma grande quantidade de revisões.
Exacto. De facto, houve algumas coisas que tiveram de ser completamente refeitas do nada. Contudo, como consequência destas revisões de grande escala, as nossas emoções estavam muito agitadas, quando ligámos as partes de cinematografia às partes de jogo. A nossa equipa também chegou a jogar o jogo e, depois de o fazer, um deles, do planeamento, veio ter comigo e disse: “Elas estão tão bem ligadas que é desconcertante.”
Desconcertantemente bem ligado! (risos). Quando penso na obsessão de Sakamoto-san, sinto que os pontos fortes deste jogo estão bem expressos nessa frase. Nagasawa-san, como um dos responsáveis pela criação da cinematografia, passaste por muitos momentos difíceis até conseguires ligar “desconcertantemente bem” as duas partes?
Na verdade, houve muitas alturas em que as coisas que criávamos, depois de despendermos uma considerável quantidade de tempo nelas, eram rejeitadas e devolvidas. Depois, nós refazíamo-las apenas para serem de novo rejeitadas e devolvidas.
A obsessão de Sakamoto-san pelo “timing” é qualquer coisa, não é?
Oh, sim, eu senti-a mesmo.
Até em algumas partes da produção de cinematografia, que normalmente são confiadas a outras pessoas, há alturas em que ele salta e intervém, se achar que é importante. Ouvi dizer que, durante as últimas etapas do projecto, ele envolveu-se profundamente no ajustamento do “espaço” – isto é, com o timing – dos fotogramas da cinematografia.
Na verdade, houve muitas alturas em que ele olhava para uma sequência cinematográfica que tivéssemos criado e não tinha quaisquer comentários para fazer, por isso, nós relaxávamos e pensávamos: “Esta está bem.” Mas, passado um pouco, inevitavelmente recebíamos um e-mail... Além disso, tecnicamente, era com Kitaura-san que ele devia estar a comunicar, mas era eu quem recebia os e-mails.
Portanto, ele ia ter contigo com as coisas que não podia dizer a Kitaura-san, Nagasawa-san? (risos)
Aparentemente, sim. (risos) E esses e-mails tinham sempre um assunto inocente: “Uma Pergunta.”’
Então esses e-mails necessitavam de um pouco de atenção especial, quando chegavam.
Sim, por isso, eu lia-os com muita, muita atenção. Costumavam ser sobre sequências cinematográficas que ele tivesse visto há pouco tempo. Ele escrevia coisas extremamente detalhadas, para que se fizessem alterações minúsculas em segmentos muito específicos, sobre quantas fracções de segundo, ou algo ainda mais pequeno, deveriam existir antes de entrar a sequência seguinte. Era do tipo “afinal, quero que seja assim” ou “reduz um pouco a sensação de tensão aqui”.
Suponho que isso acontecesse porque os pensamentos e as emoções de Samus não teriam sido devidamente retratados sem que se tivessem feito ajustes ao pormenor.
Sim. A partir da metade do projecto, Samus foi sendo confiada gradualmente a Kitaura-san, mas houve vezes em que a imagem produzida por Kitaura-san, a partir do seu “eu quero que Samus seja assim”, e a imagem original de Sakamoto-san, baseada no seu “Samus é assim”, estavam em conflito. Claro que não era o caso de um estar certo e o outro não.
Quando existem tipos obsessivos em ambos os lados, há alturas em que dirão que “isto é fantástico” e outras em que dirão que “isto está mal”.
Exactamente. Por isso é que lidávamos com uma expressão de cada vez e ajustávamos os fotogramas individualmente. Ao fazermos sistematicamente ajustes minúsculos – como, por exemplo, fazer com que os olhos de Samus piscassem no primeiro fotograma e que a boca dela se mexesse um pouco no terceiro –, procurávamos dar expressões a Samus que pudessem corresponder às imagens que ambos tinham. Aumentar a qualidade física de formas tão minuciosamente detalhadas foi muito difícil.
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