Aramaki-san, enquanto programador-chefe, em que é que encontraste dificuldades?
Em todo o tipo de coisas, mas, como podes imaginar, para se conseguir controlar o jogo com apenas um Comando Remoto Wii, foi necessário fazer muitas experiências e testes. Sempre que se juntava um membro novo à equipa, ele acabava inevitavelmente por perguntar: “Porque é que não utilizamos o Nunchuk?” Não se consegue utilizar muitos botões com apenas um Comando Remoto Wii, por isso, tivemos muitas reuniões sobre como se deveria controlar os vários movimentos de Samus.
Tiveram reuniões sobre botões?
Tivemos. E o resultado dessas reuniões foi termos conseguido criar um jogo que todos podem facilmente aprender a jogar, e em que vários movimentos podem ser executados, apesar de serem usados poucos botões. Além disso, houve muitos programadores a trabalhar neste projecto, e todos sentiram que queriam melhorar o jogo, por isso, o projecto foi rapidamente inundado de ideias. Eles não estavam apenas a programar o que lhes foi dito, todos eles viriam também a construir várias coisas da sua própria autoria, para tentar tornar o jogo mais divertido.
Então, apesar de serem programadores, eles tinham as suas próprias ideias e tentaram construí-las?
Isso mesmo. Contudo, acho que eles exageraram um pouco, e eu senti-me afogado em ideias. Houve muita “tentativa e erro” neste projecto, em que fazíamos experiências com a forma de registar estas ideias e com a forma de as encaixar no jogo.
Deve ter sido difícil, porque não podias recusar categoricamente coisas que tinham sido criadas de boa-fé.
Exactamente. A capacidade dos discos Wii também foi um problema. Ao início, pensei que conseguiríamos facilmente acomodar tudo num único disco Wii de camada dupla. Mas, depois, foi acrescentado todo o tipo de coisas...
A quantidade de sequências cinematográficas também aumentou gradualmente.
Pois aumentou! (risos) Toda a gente continuava a acrescentar as coisas que queria, de tal maneira que, no fim, os discos ficaram completamente cheios. Chegámos ao ponto de começar a converter o espaço disponível no disco em tempo disponível para a cinematografia, e começámos a dizer: “Só mais uns segundos e caberá.” Até eu fiquei surpreendido com isto.
Quando me disseram que “o jogo cabe, embora por muito pouco, num disco de camada dupla”, tenho de admitir que, por um momento, pensei que fosse uma piada. (risos)
No final, foi mesmo por muito pouco. Quando eu disse que só íamos “conseguir meter apenas mais uns minutos de sequências cinematográficas”, Sakamoto-san começava a contar os segundos das sequências cinematográficas que ele próprio tinha editado. Ele dizia coisas do tipo: “Consegui rapar dois segundos aqui, por isso, deve correr bem, não deve?” (risos)
Ah, ah! (risos)
No final, estávamos a fazer ajustes de segundos.
Mas conseguimos que coubesse lá tudo.
Fiquei muito contente por tudo ter cabido.
Sakamoto-san estava tão obcecado com este projecto, que aparentemente até contava segundos. Um pouco de perseverança pode fazer uma grande diferença no valor de um projecto com a duração de dezoito meses ou dois anos. Mas há que dizer que, se houver perseverança em todas as frentes, o projecto nunca estará terminado, por isso, é uma questão de equilíbrio.
Isso foi uma coisa que senti intensamente. Sendo a pessoa a quem tinham sido confiadas as especificações visuais deste jogo da série Metroid...
Morisawa-san, foste tu quem criou os documentos com as especificações visuais de Metroid e os deu à Team NINJA, assim como a Kitaura-san, Nagasawa-san e a outros responsáveis pela cinematografia, não foste?
Exactamente. Criei um volume enorme de documentos. A pilha era tão grande que tinha a altura de várias listas telefónicas.
Isto aconteceu porque coloquei uma quantidade enorme de questões: “De que material vai ser feita a roupa de Samus? Algodão?”; “Será que os botões da roupa dela deveriam ser prateados?”; “Que largura deverá ter este campo?”; e por aí fora.
Suponho que isso seja porque o material usado nas roupas seria também processado, para poder ser usado nas sequências cinematográficas. Decidir sobre questões como essas foi muito da tua responsabilidade, Morisawa-san? Podias decidir sem consultar Sakamoto-san?
Na maioria das vezes foi deixado à minha responsabilidade, mas houve pontos em que Sakamoto-san, decididamente, não cedia. Um exemplo que causou grande impacto em mim foi o Power Suit de Samus e a forma como a cor do fato se vai alterando à medida que as várias capacidades são desbloqueadas.
Ah, pois é, a cor muda.
Primeiro, é amarelo, depois, laranja normal, e, finalmente, transforma-se em Gravity Suit, e Samus fica violeta. Esta é especificação oficial da Nintendo, por isso, começámos naturalmente a criar o Power Suit final na cor violeta. Contudo, no final do jogo, acontecem umas cenas muito dramáticas. Quando Sakamoto-san estava a ver uma dessas sequências cinematográficas, disse: “Porque é que Samus está vestida de violeta?”
Ele disse isso, apesar de ter sido uma especificação desde o princípio. (risos)
Sim! (risos) Por isso, disse-lhe: “Ela está a usar o Gravity Suit, é por isso que está a usar violeta.” Porém, a resposta dele foi: “Mas é estranho ver aparecer, de repente, uma pessoa de cor violeta, durante uma conversa tão séria.” Depois, isto tornou-se num debate. Eu dizia-lhe: “Mas isto está nas especificações!” E ele respondia: “Não, não. Definitivamente, é estranho.”
Ah, ah! (risos)
Então, nós consultámos Kitaura-san, mas ele também dizia: “Sim, realmente, violeta é estranho.” Tudo o que eu conseguia pensar era: “Hã? Então, o que é que vamos fazer agora?” Estes tipos de especificações tinham estado ali desde o início, antes de mim. Mas eles limitavam-se a dizer: “Não, nós queremos que Samus esteja de laranja aqui, definitivamente.” Eu limitei-me a grunhir e a colocar as mãos na cabeça.
Parece que te retiraram o tapete de baixo dos pés. (risos) E como é que resolveste a situação?
Basicamente, fui buscar vários padrões de cores, numa tentativa de os puxar um pouco na direcção do violeta. Mas eles não conseguiam concordar com isso, diziam que era laranja que queriam. Todavia, no final, decidimo-nos por indicar que as funcionalidades gravitacionais estão unidas ao fato, fazendo as luzes verdes no peito de Samus brilhar num tom violeta, quando as funcionalidades gravitacionais são desbloqueadas.
Então, por outras palavras, a cor do fato permaneceu laranja, mas as cores das luzes no peito dela foram alteradas para um tom violeta?
Sim. Nós explicámos claramente no manual mas, enquanto pessoa a quem foram confiadas as especificações visuais de Metroid, achava que aquilo não estava correcto. Mais tarde, lembrei-me de quando trabalhei em Metroid, para a Game Boy Advance. Nessa altura, um membro da equipa veio ter comigo e disse: “As especificações do jogo anterior dizem isto, mas, desta vez, é um pouco diferente, está bem?” Nessa altura, fui eu quem foi contra as especificações. Foi aí que pensei que os títulos da série Metroid eram como o molho num restaurante de enguias centenário...
Molho? (risos)
Sim. Quando se vai a um restaurante de enguias, eles costumam dizer coisas do tipo: “O nosso molho tem cem anos.” Mas isto não significa que o molho tenha permanecido intocado dentro do frasco. Eles estão permanentemente a alterar o molho, para o adaptar aos gostos de cada época, e o sabor do molho muda frequentemente.
Então, usaste esta teoria de que não há problema em alterar as coisas aos poucos, muito como o “molho com cem anos”, para que conseguisses concordar com as alterações ao jogo.
Sim, consegui concordar… Ou melhor, consegui colocar-me numa situação em que era capaz de compreender... (risos) Bem, ainda assim, tentei proteger a tradição, e eu acho que é importante ser capaz de criar coisas novas sem ficar amarrado a ela.
É certamente verdade que as especificações ficam cada vez mais detalhadas, mais enraizadas e, às vezes, acabas por ficar preso, incapaz de te mexer. Neste sentido, o desenvolvimento dos títulos da série Mario tem dois lados diferentes, um em que há uma mentalidade muito aberta e outro que é muito rígido. Se tirássemos dos títulos da série Mario o lado com mentalidade aberta, eles começariam, gradualmente, a ficar mais rígidos, e nós nunca teríamos o Mario que temos agora... Apesar disto, continua a ser duro quando tiram o tapete de baixo dos teus pés.
De facto, é! (risos)
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