Falemos novamente de Super Mario Bros.. Podes referir algo do início do processo de desenvolvimento que te tenha ficado particularmente na memória?
Lembro-me claramente que, mesmo no início do processo de desenvolvimento, o céu azul aparecia no ecrã.
Os jogos até então tinham sempre fundos pretos, não era?
Era. Na altura, não havia mais nada no ecrã para além do céu azul com nuvens brancas e o chão, mas a imagem saltava do ecrã e eu só pensava: “É incrível!”
Nunca tinhas visto nada assim?
Não, nunca tinha visto nada assim. Quando vi aquela imagem, já era muito tarde mas liguei à mesma a Miyamoto-san e disse: “Criámos uma coisa espectacular!” (risos)
(risos)
Até eu fiquei surpreendido por a Famicom conseguir mostrar gráficos tão vívidos.
Com esse ecrã como base, depois partiram para a criação dos mapas, certo?
Certo. Miyamoto-san disse-me logo ao início: “Faz o jogo de modo a que um nível demore cerca de um minuto a completar.” Mas, num jogo normal, consegues percorrer um ecrã num segundo.
Portanto, se demoras um segundo a percorrer um ecrã e queres que o nível demore um minuto, tens de ter 60 ecrãs.
Por isso mesmo é que perguntei: “Vamos mesmo fazer estes ecrãs Todos?” Ao que Miyamoto-san respondeu: “Como vamos ter uma data de coisas a acontecer pelo meio, 20 ecrãs devem ser o suficiente para um nível.” Na altura, não consegui perceber o que Miyamoto-san queria dizer.
Imagino que, embora o ecrã na altura só tivesse céu azul, nuvens e chão, Miyamoto-san já tinha mil e uma ideias concretas em mente.
Parece-me que sim. Acabámos por nem sequer usar os 20 ecrãs.
Quando criámos de facto os níveis, acabámos por só precisar de cerca de 12.
Sim, foi mais ou menos isso.
Até o nível maior, ao qual dedicámos toda a nossa energia, só precisou de 32 ecrãs. Só houve um nível assim, Todos os outros puderam perfeitamente ser mais pequenos.
Estou a ver.
E apesar de Miyamoto-san não ter planos para os níveis, conseguia antever o que se seguia. Ficava verdadeiramente impressionado quando o ouvia dizer com toda a confiança do mundo o que devíamos fazer a seguir.
Como se processou a criação dos níveis?
Os dados dos níveis foram inseridos manualmente. Desenhávamos o nível num papel que depois entregávamos à SDR, pedindo: “Queiram por favor fazer com que se pareça com isto.”
Tezuka-san ou Miyamoto-san desenhavam o nível num pedaço enorme de papel milimétrico e tínhamos de inserir cuidadosamente os dados à mão.
Era um processo moroso.
E se o mapa era modificado, era uma verdadeira dor de cabeça.
Absolutamente. Todas as manhãs, quando chegava ao escritório, davam-me para as mãos umas 20 folhas de papel e diziam-me para começar a trabalhar.
E davam-te recados a dizer coisas tipo: “Por favor faz as seguintes modificações ao mapa.”
Sim, as instruções eram escritas a lápis. Ficávamos o dia todo a estudar essas notas e a ajustar o mapa. Às dez da noite, quando finalmente acabávamos, gravávamos os dados no ROM e dois deles jogavam o nível. Depois, se houvesse modificações a fazer, recebia mais instruções de manhã. E este processo repetia-se vezes sem conta.
Era um ciclo diário.
Conseguíamos fazer os ajustes necessários num ciclo de um dia. Em comparação, a forma como se faz agora as coisas é paradisíaca. Agora conseguimos modificar um nível 10 ou 20 vezes num só dia.
Hoje em dia, da forma como se fazem os níveis, pode-se pedir para mudar só um pormenor e ver a alteração de imediato. Podes jogar o nível logo de seguida.
Fazer isso costumava demorar um dia inteiro.
Agora que falamos nisso... Ouvi dizer que quando criaram os níveis para Super Mario, não começaram pelo primeiro ecrã.
Pois não. É possível que tenhamos começado pelo “World 3” ou “World 5”. Eram os mais divertidos. Mas, apesar de serem divertidos, quando pedimos a pessoas sem experiência de jogo para os testar apercebemo-nos que eram incrivelmente difíceis. Nesses casos, o nosso princípio básico é transferir os elementos mais fáceis para o início do nível.
Acho que a maioria das pessoas parte do princípio que começariam a fazer o nível pelo primeiro ecrã e avançar a partir daí. Mas não é, de todo, essa a realidade. Falámos disto na última entrevista de Iwata Pergunta: achei que o design do nível para o início do “World 1-1” era realmente espantoso.
Ah, estás a falar da forma como foi desenhado, de modo a que o jogador apanhe sempre o cogumelo.
Precisamente. Fiquei muito impressionado quando soube disso e, apesar de não ter nada a ver com a ideia, andei por aí a gabar-me dela! (risos) Sempre que alguém fica a saber que o nível foi criado deliberadamente com esse objectivo, fica extremamente impressionado. Como surgiu a ideia?
Trabalhámos a ideia essencialmente em papel. Começávamos por traçar as linhas gerais e Miyamoto-san apresentava ideias bem firmes: “Vamos começar aqui e fazer isto ali...”
Então simulavam o processo de jogar o nível em papel, pensando como se fossem o jogador e no que ele gostaria de fazer a seguir.
Exactamente.
E tentávamos pensar nas várias possibilidades. Por exemplo, pensávamos que o habitual seria o jogador apanhar o cogumelo, mas só para o caso de não o fazer, apanhá-lo-ia da outra forma.
Por isso é que puseram o primeiro cano naquele sítio.
Pois, porque quando o cogumelo vai contra o cano volta para trás. Mesmo no princípio do “World 1-1”, Todos os elementos de Super Mario estão presentes e correctos.
Então o nível 1-1 foi feito mais para o final do desenvolvimento?
Foi. Tenho a certeza absoluta que criámos esse nível no final. E o “World 1-1” também foi um nível que ainda estava a ser ajustado nos últimos momentos.
Na altura em que o jogo foi lançado, ainda não havia guias de estratégia. Quando o jogador começava a jogar pela primeira vez, era provável que não tivesse lido o manual de instruções nenhum e não havia ninguém que lhe dissesse o que fazer. Em relação a Super Mario, não havia excepções: ninguém tinha experiência. Por isso, desenharam o jogo com um cuidado especial para que o jogador se familiarizasse com a forma como as coisas funcionavam e se deixasse envolver nesse mundo de forma natural.
Sim, estávamos extremamente conscientes dessa necessidade.
Em particular, no que diz respeito ao nível “World 1-1”.
E foi, sem dúvida, por isso que tantos jogadores responderam positivamente a Super Mario.
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