Nesta entrevista, vamos falar sobre New Super Mario Bros. Wii. Mas, em vez de partirmos logo para uma discussão sobre este novo título, gostaria de começar por falar sobre as raízes de Mario. Claro que há muitos leitores que conhecem a história, mas creio que também há quem não faça ideia como Mario começou.
Sim, sim. Tens razão.
E que tal começarmos por falar sobre o período da concepção inicial de Mario, quando ele era conhecido como “Jumpman", o homem dos saltos?
1 Pac-Man era um jogo arcade, tendo sido publicado em 1980 pela Namco (agora Namco Bandai Games Inc.). Enorme êxito mundial, foi posteriormente lançado para a Nintendo Entertainment System. 2 Sheriff era um shooter, tendo sido publicado em 1979, em que o herói tem de derrotar 16 criminosos. Também apareceu como minijogo em WarioWare, Inc.: Minigame Mania para a consola Game Boy Advance.
Isto numa altura em que a Nintendo ainda não tinha lançado a consola Nintendo Entertainment System e em que, apesar de ter criado várias máquinas arcade, ainda não tinha conseguido fazer um jogo de sucesso.
Exactamente. Foi nesse momento que o presidente da Nintendo da altura, Yamauchi-san, nos disse: “Façam jogos que vendam mais!”
"Façam jogos que vendam mais!” Que bela tarefa vos foi atribuída! (risos)
Bela tarefa, mesmo! (risos) Por isso, decidimos investigar o que tornava um jogo popular. Bem, quando digo “investigar”, quero dizer jogar os grandes êxitos! (risos)
Jogar em nome da investigação! (risos)
Como deves calcular, era um grande fã de jogos. Além disso, enquanto agora há imensas pessoas na Nintendo com grande talento para jogar, na altura eu era um dos melhores jogadores.
As pessoas juntavam-se à tua volta no salão de jogos só para te ver jogar, não era?
Mal dava por mim, já tinha uma multidão à minha volta!
Houve uma altura em que eu próprio era o centro de muitas atenções!
3 Nos jogos de comer pontos (dot-eating games), o jogador tentava escapar a inimigos num labirinto ao mesmo tempo que passava sobre pontos ou bolinhas para aumentar a pontuação.
Sim, nos salões de jogos da altura havia vários tipos diferentes de jogos centrados na acção de comer pontos.
Sim. Na altura, também já começavam a aparecer jogos de scroll lateral, onde a personagem corre numa direcção. Como eu era, originalmente, designer industrial, analisava os jogos enquanto os jogava, tentando descobrir quais os elementos que os tornavam tão divertidos e que levavam as pessoas a jogá-los vezes e vezes sem conta.
Então querias saber o que levava o jogador a meter mais uma moeda depois de o jogo acabar, para poder tentar outra vez?
4 Gunpei Yokoi (1941-1997) trabalhou na Nintendo principalmente como criador de produtos tais como Game & Watch e a consola portátil Game Boy, assim como o robô NES ou Robotic Operating Buddy (R.O.B.) e Dr. Mario.
Desenhavas imagens pixelizadas e criavas as imagens que se usavam nas máquinas arcade…
Estava envolvido na criação de jogos para salões arcade, mas o tipo de ideias que sugeria não eram utilizadas... Contudo, quando tive a sorte de me darem para as mãos a criação e desenvolvimento de um título...
Então foi esse o grande momento de viragem na tua evolução enquanto designer de jogos?
5 Popeye é uma personagem popular de desenhos animados americanos. Outras personagens conhecidas acompanham o herói: Olívia Palito e Brutus.
Sim, a empresa ia publicar jogos de cartas Popeye e títulos Popeye Game & Watch.
Foi por isso que, no princípio, me perguntaram se podia fazer um jogo com a personagem Popeye. O conceito básico de Popeye é haver um herói e um rival, que o herói consegue derrotar com a ajuda de espinafres.
Pondo as coisas dessa maneira, é o conceito do Pac-Man, não é? (risos)
6 Donkey Kong foi o título de estreia do designer de jogos Shigeru Miyamoto. Surgiu nos salões de jogos em 1981 e foi publicado para a Nintendo Entertainment System em 1983.
Mas, originalmente, ia ser um jogo Popeye.
Exactamente. Mas, apesar de não me lembrar bem do motivo, não pudemos usar Popeye nesse título. Senti que nos tinham abandonado, que nos tinham tirado o escadote a meio da subida.
Então, apesar de estarem a criar um jogo em que se tem de subir escadotes, na vida real nem sequer conseguiam chegar lá acima! (risos)
Bem visto! Acho que mereces uma salva de palmas só por essa! (risos) De qualquer modo, na altura não sabíamos o que fazer a seguir. E depois pensámos: “Porque não criamos a nossa própria personagem?"
Então, Donkey Kong e Mario surgiram depois de vos terem estragado os planos.
Sim.
Miyamoto-san, tens cá uma sorte…
Foi mesmo um golpe de sorte! Então, começámos a enriquecer a ideia para o jogo, baseando-nos no conceito criado. Bem, um jogo divertido deve ser fácil de compreender – o jogador deve poder olhar para o jogo e perceber de imediato o que tem de fazer. Deve ser tão bem feito que o jogador consiga perceber à primeira vista qual é o objectivo, de tal modo que se não conseguir alcançá-lo se culpe a si mesmo e não ao jogo. E, além disso, as pessoas que ficam a observar outra pessoa a jogar também devem divertir-se. Foram estes assuntos que discutimos com Yokoi-san.
Estavam, portanto, a analisar o que tornava um jogo divertido.
Isso mesmo. Digamos que, por exemplo, há uma acção no jogo que o jogador pode completar facilmente. Depois, acrescentamos outra acção simples. Estas acções podem ser fáceis, mas quando o jogador tem de as fazer ao mesmo tempo, a história é outra.
Embora essas acções sejam fáceis de completar isoladamente, quando ele tenta fazê-las em simultâneo tornam-se mais difíceis. E é precisamente por pensar que vão ser fáceis que o jogador fica zangado consigo mesmo, porque não conseguiu alcançar o objectivo, certo?
Precisamente. Imagina que fazemos uma série de declives desnivelados e sobrepostos…
Onde tens de subir escadotes, saltar e por aí a fora.
Estás a tentar alcançar o objectivo em segurança, usando atalhos enquanto tentas prever constantemente a rota dos barris que rolam na tua direcção. É fácil escalares cada vez mais alto. Também é fácil desviares-te de barris rolantes. Mas quando tentas fazer estas duas coisas ao mesmo tempo, o desafio é maior. Além disso, também tens de pensar qual o caminho mais curto, por isso torna-se ainda mais difícil. Pensámos que podíamos trabalhar com este conceito. Foi nesse momento que tentámos fazer um ecrã que se deslocasse e nos disseram: “A placa não faz scroll!” (risos)
A "placa" que acabaste de referir é a placa de circuito dentro da própria máquina arcade. Na altura, havia uma certa individualidade, digamos assim, nas máquinas e, dependendo do tipo específico de hardware, cada qual tinha determinadas limitações. Quando começámos a trabalhar em Donkey Kong, a caixa que devíamos usar para conter a placa não permitia que os jogos fizessem scroll.
Como queríamos que o título fosse jogado em pelo menos quatro ecrãs interligados, simplesmente referimo-nos a isso como scrolling. (risos)
Então o facto de Donkey Kong ser jogado em quatro ecrãs surgiu do desejo original de fazer scroll?
Exactamente. O supervisor técnico da altura perguntou-nos em que raio estávamos a pensar: "Um ecrã é mais do que suficiente para um jogo normal! Mas estão a fazer quatro ecrãs diferentes! Mais valia pedir para fazermos quatro jogos diferentes!”
Mas estavas absolutamente determinado em fazê-lo dessa forma.
Estava, sim. Também me lembro que a caixa do jogo tinha um joystick e um botão, mas inicialmente queria que o joystick fosse o único controlo.
Queres dizer que se a caixa não tivesse um botão, o Mario não saltaria? Agora quando se pensa em Mario, pensa-se nele a saltar! (risos)
Bem, talvez. Originalmente, tratava-se de um jogo em que tinhas de fugir de um labirinto. Permitir que os jogadores saltassem e evitassem os perigos ia estragar o elemento estratégico do jogo. Mas depois pensámos: “Se visses um barril a rolar na tua direcção, o que farias?”
Tinhas de evitar os barris enquanto subias paredes pelo labirinto e isso obrigaria a muita energia e determinação.
E já viram que, se tivesse sido possível saltar pressionando o joystick para cima, o nome “jump button” não existiria? No segundo nível, tínhamos elevadores verticais e ficámos a pensar como é que o jogador conseguiria entrar neles. Mas se Mario saltasse...
Entrar e sair do elevador seria canja! (risos)
Foi nessa altura que decidimos que saltar era essencial, e foi uma boa decisão.
* Para mais detalhes sobre conseguir “revolver várias questões ao mesmo tempo”, lê esta discussão com o presidente Iwatasee.
Também conseguimos dar uso àquele botão extra! (risos) E esta é a história de como Mario começou a saltar.
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