Voltando ao Mario 64, uma vez em que Kotabe-san estava a olhar para trás no tempo, ele disse que podia finalmente fazer o que sempre quis.
Eu disse isso?
Miyamoto-san falou-me dessa conversa contigo.
Não disseste que estavas feliz com o que se tinha tornado possível nessa altura, mas que podias fazer o que sempre tinhas querido. Isso fez-me realmente feliz.
Inicialmente havia tantas restrições.
Durante tanto tempo só conseguíamos fazer tão pouco, mas manteve-se connosco.
Houve outra coisa nessa época que me impressionou fortemente. Assim que os jogos se tornassem 3-D, tornar-se-iam normalmente mais realistas, o que eu pensei que envolveria introduzir a captura de movimento. Quando rejeitaram isso, fiquei surpreendido.
Oh?
Apesar de normalmente querermos usar elementos reais, rejeitaram isso e foram numa direcção diferente. Pensei que isso era algo realmente importante.
Porque é que não querias usar captura de movimento?
Bem, muito tempo antes quando estava a criar o Popeye, não sabia desenhar bem, por isso copiava tudo quando criava a animação, mas quando se jogava o jogo dessa forma a resposta não era muito boa.
Mesmo que Popeye pareça movimentar-se suavemente a olho nu, não o conseguimos movimentar como queremos, o que não me parecia ser bom para o mundo dos videojogos.
Quando carregamos num botão, queremos uma resposta imediata. Se há um movimento preparatório antes dela, não nos parece bem.
Por exemplo, quando carregamos num botão, Link puxa imediatamente a sua espada, mas depois volta lentamente atrás, e na segunda vez faz um golpe limpo. Assim, quando decidi combinar o movimento suave e a interactividade satisfatória, sabia que simplesmente importar técnicas de animação existentes não chegaria.
É verdade.
O nosso ponto forte era que iríamos pensar seriamente nisso e tentar alcançá-lo. Durante algum tempo eu só pensei nisso.
Não estava a rejeitar o movimento realista. Estava a dar prioridade à sensação que se tinha a jogar o jogo em vez de ao movimento suave. E quando mostrar o movimento era um elemento importante, enfatizávamos os movimentos suaves. Lembro-me de ocasiões em que falei com bastante fervor sobre estes assuntos.
Estou a ver.
Mas depois de te teres envolvido no Pokémon, não passámos praticamente mais tempo nenhum a trabalhar juntos.
Começámos a criar o Pokémon Stadium18 e Pokémon Snap19 ao mesmo tempo.
18 Pokémon Stadium foi lançado originalmente para a Nintendo 64 em 1998. Ligava-se com software para a Game Boy.
19 Pokémon Snap é um jogo de acção na primeira pessoa lançado originalmente para a Nintendo 64 em 1999.
Quando começámos, sabíamos que teríamos que criar 151 monstros.
Tudo o que tínhamos eram dados bidimensionais, por isso tínhamos que os alterar para modelos 3-D um a um.
Mas foram uns tempos divertidos. Senti-me como se me tivesse tornado um escultor. Começávamos com um modelo, girávamo-lo, e eu dizia, “Oh, isto tem que ser desbastado.”
Sim, lembro-me disso. Ficávamos a ver o modelo a girar e alterávamos os pontos que apontava, e rapidamente o aspecto começava a melhorar. Perguntava-me como funcionaria. Estava fora da minha área de especialidade, por isso era como ver magia.
Eu não podia mover o modelo sozinho, por isso sentia que era um esforço de grupo. Mas estava entalado contra a secretária, por isso pensava que talvez estivesse a enervar toda a gente com quem trabalhava.
Não, de todo. Sempre que dava algum tipo de instrução, era como se um raio de compreensão atingisse toda a gente. Como consegue fazer essa magia?
É o mesmo que na animação convencional, a qual não é realmente unilateral. Temos que a fazer mover-se, por isso imaginamos as partes que não conseguimos ver enquanto desenhamos.
Penso que Kotabe-san tem uma câmara na cabeça. O que me surpreendeu mais quando ele desenhou pela primeira vez uma imagem para mim foi que cada imagem reflectia uma posição da câmara.
Ele conseguia desenhar de perspectivas diferentes.
Dependendo da imagem, o ponto de vista pode ser olhar para cima ligeiramente de baixo ou vice-versa. Quando transformámos os monstros Pokémon em 3-D, Kotabe-san deve ter sido capaz de imaginar que aspecto deveriam ter usando a câmara na sua cabeça.
Estou a ver. Outra coisa em que reparei quando vos vi a trabalhar no Pokémon foi como Kotabe-san é bom a elogiar.
É realmente. Faz tudo o que pode para encontrar algo que possa elogiar, e então elogia. Ele nunca diria, “Oh, isso não presta,” mas antes, “Tem certamente carácter.”
O meu trabalho costumava ser desenhar a animação-chave e verificar as “key frames” dos outros. Essas imagens estão impregnadas do entusiasmo do artista. É por isso que é melhor direccionar o entusiasmo para as correcções. Consigo sentir o bom em toda a gente.
Através da criação dos seus produtos, a Nintendo encontrou Kotabe-san. Ele pensou que apenas estaria cá um par de anos, mas quando deu por isso tinha ficado 21! Ao longo desse percurso, criou numerosos discípulos…
Sem dúvida que o fez.
Ao longo da sua longa história, a Nintendo esteve rodeada de todos os tipos de boa sorte. Poder-se-ia dizer que a nossa relação com Kotabe-san é um exemplo da imensa boa sorte da Nintendo.
A propósito, Kotabe-san, publicou um livro de arte de animação chamado “Collection of Yoichi Kotabe’s Animation Arts”, não foi?
Sim. Falou-se durante algum tempo sobre publicar um livro sobre a arte da animação, mas eu pensei que era uma piada. Eu nem sequer sabia se muita da minha arte original ainda existia. Mas há vários anos, quando remodelámos a nossa casa, encontrei um cesto de verga cheio de arte antiga no fundo de um armário. Mostrei os trabalhos que tirei de lá a um editor e ele encontrou muita coisa que queria pôr no livro. Mesmo quando eu resisti porque considerava algo embaraçoso, ele insistia. Até desconfiou que eu tinha mais algumas coisas escondidas!
(risos)
Pusemos tanta coisa no livro que acabou por não sobrar nada!
Quantas ilustrações contém?
Tantas que nem sei. Alguns dos trabalhos são de movimento animado, por isso decidimos chamar-lhe um livro de arte de animação em vez de apenas livro de arte. Tem também imensos desenhos de concepção de personagens. É sobretudo essas duas coisas.
Espero que muitas pessoas venham a conhecer o seu trabalho através deste livro.
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