Uma coisa que tento fazer é não tornar as coisas exaustivas.
Ah sim?
Quando discutimos as opções A e B, alguém dirá “Também existe a opção F!” Depois, a pessoa que está obcecada com o trabalho árduo dirá que existem as opções C, D, E, F e G, como se estivéssemos a tentar considerar todas as hipóteses. Mas quando se trata de produzir algo de valioso, por vezes é mais divertido ter as opções A e B. Claro que ter inúmeras possibilidades, como no Google, é algo completamente diferente.
Sim, concordo.
O teu trabalho não é exaustivo, pois não?
Não.
Por exemplo, quando se trata de uma personagem famosa como Mario, sei que existiam limitações técnicas como o número de píxeis que poderia ser usado, mas para ser mesmo exaustivo, não deverias ter inventado outros designs para além de um homem de meia-idade com um bigode? Quer dizer, é um jogo que as crianças irão jogar, e tu acabaste por apresentar um senhor de meia-idade com um bigode.
Sim. (risos) Quando inventei Mario, provavelmente desenhei outra opção. Um esboço apenas. A lápis.
Então...opções A e B. (risos)
Sim, não tive nenhum motivo secreto, como desenhar uma alternativa só para fazer o desenho do qual eu gostava mesmo parecer melhor, apenas desenhei dois. Afinal, nessa altura, estava a fazer os desenhos e os planos praticamente sozinho e só após estar tudo terminado é que pensávamos na forma de o vender. Por outras palavras, ninguém viu o meu trabalho. O programador ficava feliz se eu desenhasse alguma coisa e lha mostrasse.
Então poliste a opção A.
Sim. Mas estávamos a criar o software para a NES nessa altura, por isso existiam também limites de capacidade.
OK.
Mas mesmo quando estávamos a enfrentar limitações como restrições de capacidade, se algo me preocupava, aplicava-me mesmo. Por exemplo, tomámos a decisão de que Mario entraria por um Warp Pipe a partir de cima porque de lado não funcionaria.
Estou a ver.
E lembras-te de quando de repente desces para o subsolo após terminares o World 1-1?
Sim.
Achei estranha a forma como Mario já está no subsolo quando esse nível começa. Porque está Mario, que acabou de passar em frente a um castelo, no subsolo? Não consegui encaixar uma sequência que mostrasse como ele cai para o subsolo, logo, decidi que ele iria cair do topo do ecrã, e, surpreendentemente, isso resultou na perfeição. Se alguém me tivesse pedido para dar um pouco mais de detalhe neste ponto, o resultado teria sido diferente.
Por outras palavras, costumavam existir mais limitações, pelo que tinhas de te concentrar no que era mais importante e pensar de forma simples.
Sim, penso mesmo que sim. As limitações eram quase sempre uma grande ajuda. Os jogadores podiam imaginar os detalhes que não eram incluídos.
Em termos do alfabeto, só tinhas de te preocupar com as opções A e B. Os miúdos de hoje, não podendo regressar aos tempos em que só havia um par de opções, poderão ter de trabalhar de forma completamente diferente.
Verdade. Sinto um pouco de pena deles.
Há bocado fizemos a analogia do homem e da mulher prestes a casar e de como as várias decisões que têm de tomar se podem reduzir a um simples facto: casar ou não casar. Isso é basicamente regressar a uma escolha simples entre A e B.
Certo.
Tens de habituar-te a pensar em formas fáceis de fazer as coisas. Essa é uma abordagem completamente diferente da intenção de simplesmente trabalhar no duro.
E, por exemplo, a questão de quantos títulos lançaríamos em cada ano costumava ser simples. Era algo como dois jogos por ano, e se não os lançássemos, não ganharíamos dinheiro nenhum.
Estou a ver.
Percebemos instintivamente o que implicaria não lançar pelo menos um jogo todos os anos na época do Natal. Quando é esse o caso, a tua única opção é decidir lançar um jogo e simplesmente definir prioridades.
Sim. Para estar dentro do prazo.
Certo. Gradualmente evoluiu para dez jogos por ano, depois 20, e quando começas a lidar com muitos jogos ao mesmo tempo, a sua realidade começa a desaparecer. Depois começas a pensar em todo o tipo de coisas.
As pessoas já não se unem com o único objectivo de lançar um jogo.
Certo. Isso poderia ter-me acontecido também, mas consegui ultrapassá-lo. Sabes, quando me juntei à direcção, as coisas voltaram a ser simples.
Aha, estou a ver…
Quando fazes parte da direcção, percebes claramente o que acontecerá se não lançares títulos suficientes no fim do ano.
Certo.
Quanto mais vês as coisas de uma perspectiva de gestão, mais consegues pensar nas coisas de forma simples.
Essa é uma grande descoberta, não é?
Poderá ser, sim! (risos)
Sim. Muitas vezes, as pessoas dizem que tens de adoptar o ponto de vista de um executivo, e que, quando te apercebes de que és tu quem está a gerir a empresa, começas a ver os problemas que isso implica. Ou seja, pensar com a cabeça de um director ou gestor torna os problemas mais simples.
Penso que sim. É por isso que, ao longo de cerca de dez anos, tenho mantido as coisas simples. Mas a equipa segue numa direcção mais complicada. Essa diferença é interessante. Mas algo que gostaria de dizer para evitar mal-entendidos é que uma empresa é, na verdade, suportada por essas pessoas complicadas.
Uh-huh…
Percebo isso. Mas algo sobre o qual tenho vindo a ponderar há algum tempo é como é que eu, percebendo isso totalmente, posso fazer com que essas pessoas façam as coisas de forma simples. O meu trabalho há já alguns anos tem sido explicar, com todo o meu poder, a essas pessoas que por vezes é também necessário pensar de forma simples. Mas, para ser honesto, acho que eu próprio mantenho as duas atitudes. (risos)
Sim, consigo ver isso.
(risos)
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