Ao falar com a equipa responsável pelo Ocarina of Time original no decurso de duas conversas, perguntei-me porque se divertiam tanto a falar sobre ele. Senti que, talvez, eles tivessem gostado de assistir às melhorias diárias do jogo.
Sim.
E ao falar contigo hoje, fiquei a saber que durante um curto período de tempo, descobriste muitas coisas novas. Foi um período concentrado de sucessivas descobertas em que pensavas: “Oh, estou a ver!” e “Oh, só preciso de o fazer assim!”
É por isso que todos os dias eram divertidos.
Quando cada dia traz novas descobertas e elas estão altamente concentradas, é divertido para a pessoa que o está a fazer, independentemente do quão exigente seja fisicamente ou do tempo que tenhas de trabalhar nele.
Certo. Por outro lado, nem sempre é divertido quando estás a produzir um jogo com toda a tua habilidade usando métodos a que estás habituado.
Certo.
Mas quando passas do 2D para o 3D, descobres muitas coisas, como, por exemplo, coisas que já não são divertidas. Por exemplo, cortar a relva foi algo que apareceu pela primeira vez na série The Legend of Zelda com The Legend of Zelda: A Link to the Past.13 Quando o fizemos, foi surpreendentemente divertido. Algumas pessoas começaram a dizer que neste videojogo cortas relva usando o Spin Attack! (risos) 13.The Legend of Zelda: A Link to the Past: Um jogo de ação e aventura lançado para a Super Famicom no Japão em novembro de 1991.
(risos)
Mas quando incluímos esse elemento de cortar relva em The Legend of Zelda: Ocarina of Time, foi como se tivéssemos recebido ordens para o fazermos.
Não podias ter a certeza de que se mudasses o corte de relva para 3D, isso seria muito mais divertido.
Exatamente. Quando estávamos a dizer que simplesmente refazer esse tópico velho de forma mais bonita não era particularmente impressionante, começámos a falar de como seria estranho poder cortar a relva mas não poder cortar as tabuletas.
Então pediste a Morita-san para tratar disso. Ele disse-me. (risos)
Ai sim? (risos) Conseguimos cortar as tabuletas, mas depois saberíamos que as pessoas as cortariam em direções diferentes. Quando disse que as tabuletas deveriam ser cortadas na diagonal quando Link abana a espada na diagonal, toda a gente parou e disse: “Não podemos ter a certeza do local exato onde as cortam!”
Querias que as tabuletas fossem cortadas no local exato onde as golpeavas?
Mesmo com a Nintendo 64, isso seria impossível. Então disse: “Não, temos de fazer diferentes padrões de corte.”
Então fizeste com que o dividissem em seis peças, como uma caixa de queijinhos.
Certo. Então poderias cortar as tabuletas a partir de direções diferentes, mas depois um pedaço voava para longe e ia parar ao lago. Uma vez que não tínhamos trabalhado na deteção de colisão quando atingisse a água, cairía no fundo do lago com um estalido.
Seria esquisito se fizesse um ruído quando aterrasse na água.
No geral, decidirias apenas não colocar uma tabuleta ao pé da água, mas Morita-san fez com que o pedaço da tabuleta flutuasse na água.
E fica à deriva até se afastar.
Sim. Morita-san fez isso porque tinha a certeza de que os jogadores iriam adorar. Depois só queríamos pôr tabuletas à beira da água!
Haruhana-san descreveu isso como uma hospitalidade que ataca.
Oh…
Por outras palavras, o jogo é muito hospitaleiro, mas com uma certa aspereza. Essa hospitalidade está em todo o lado, à espera que alguém entre para que possa atacar!
Tal como numa mansão assombrada.
Certo. Ataca tal como numa mansão assombrada. (risos)
Penso que “hospitalidade” é a palavra certa, sim. Por exemplo, tínhamos usado a ideia de nos agarrarmos a uma galinha e de voarmos com o jogo na Super Famicom. Pensei que seria estranho se os gráficos fossem mais realistas mas quando o fizemos, fiquei contente ao ver que se encaixava na perfeição. Apercebi-me de que esses tipos de coisas são mais divertidos num espaço 3D, pelo que disse de repente: “Vamos fazer os relevos mais tridmensionais.”
Mudaste as superfícies para permitir o voo de galinhas.
Depois, por volta dessa altura, qualquer aldeia que visse, pensava que era um pouco simples e aborrecida. Comecei a referenciar aldeias em distritos montanhosos na China, como os que verias provavelmente num documentário televisivo. Eu dizia: “Veem? Existe todo o tipo de aldeias!” e: “Não podemos fazer uma aldeia mais distinta?” E nessa altura, ligou-se perfeitamente com as galinhas.
Colocaste mais declives nas aldeias para melhorares a sensação de voares com as galinhas.
Sim. Isso também era uma espécie de hospitalidade. Depois de mudarmos as aldeias, continuámos nesse espírito e reformulámos o Zora’s River para que tivesse mais declive.
Depois de trabalhares numa coisa, encontravas outra coisa para fazer.
Certo. Originalmente, a única coisa escrita nas especificações sobre Zora’s River era: “Transforma-a numa superfície invulgar.” (risos)
Isso é muito vago! (risos)
Mas isso foi o suficiente para (Makoto) Miyanaga-san e os outros, que estavam a cargo das superfícies. Poderias apenas dizer: “Façamos uma aldeia distinta” ou “Façamos um castelo muito casteleiro.” (risos)
(risos)
Para Zora’s River, era “Transforma-a numa superfície invulgar.” Mas a natureza real é espetacular. Muitas superfícies terrestres reais ultrapassam a imaginação humana, por isso as nossas não conseguem competir.
Suponho que não.
Quando voas para norte num avião…
Como quando vais à Europa.
Como se fosses da Europa à América? Quando olhas para baixo de um ponto de vista do Círculo Ártico, vês muitas superfícies terrestres estranhas que te fazem querer ir para baixo e dar uma vista de olhos.
Mas se o fizesses, provavelmente seria um local duro. (risos)
Sim. Se fosses lá, nunca regressarias! (risos) Quando vejo locais assim, apercebo-me dos limites do pensamento humano. Mesmo que fizéssemos algo verdadeiramente invulgar com os polígonos, por alguma razão continuaria a parecer um cenário de paisagem que verias na vida real. Fazer esse tipo de coisas todos os dias era mesmo prazeroso.
Mais descobertas concentradas.
Certo. Quando estávamos a fazer The Legend of Zelda: Ocarina of Time, concentrámos as nossas energias em coisas novas.
É comovente ver alguém a esforçar-se tanto por fazer uma coisa.
Sim. Mas para nós, que estamos a fazer o jogo, pensámos até ao fim em como isto e aquilo ainda não estavam no ponto certo. Por exemplo, existe a Gossip Stone em que podes ouvir dicas e rumores. Se puseres uma bomba ao lado dela…
Levanta voo como um foguete. Quando vi isso pela primeira vez, fiquei espantado. (risos)
Incluímos isso lá mais para o final. Incluímos tantas Gossip Stones no local que começámos a ficar sem diálogos, então eu disse: “Eles que digam as horas.” (risos)
(risos)
Era como dizer: “Pedra errada. Boa sorte para a próxima.” (risos)
Sim, do género: “Tenta outra vez.” (risos)
Assim, até ao final dizíamos: “Falta qualquer coisa” e “Isto é mesmo suficientemente bom?”
Suponho que foi assim que toda a hospitalidade no ataque entrou no jogo.
Penso que sim!
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